Neuropsicologia
Escrito
por Vinicius Sampaio D´Ottaviano
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Resumo: O conceito de plasticidade não é
único, embora seja antigo na literatura científica, não existe teoria
unificadora dos fenômenos neuroplásticos, as abordagens experimentais são
múltiplas e os resultados muitas vezes conflitantes. Pode-se considerá-la como
a tendência do sistema nervoso a ajustar-se perante influências ambientais
durante o desenvolvimento, e estabelecer ou restaurar funções desorganizadas
por condições patológicas ou experimentais.
Palavras-Chave: conceito, plasticidade, neuroplásticos, sistema nervoso, desenvolvimento, patológicas e experimentais.
Palavras-Chave: conceito, plasticidade, neuroplásticos, sistema nervoso, desenvolvimento, patológicas e experimentais.
Existem hoje em dia vários conceitos sobre a definição de
neuroplasticidade humana, desta forma, percebe-se o vínculo dos fenômenos
plásticos com o desenvolvimento ontogenético do sistema nervoso, assim como a
capacidade de resposta compensatória frente a lesões e outras influências
externas; daí a neuroplasticidade poder ser encarada sob vários ângulos,
dependendo tanto da abordagem experimental que se fizer, como de cada modo
concreto de existência e expressão funcional do sistema nervoso.
A partir do trabalho de Kennard (1944), consideram-se dotados
de maior plasticidade os cérebros embrionários ou neonatos, em comparação com
os cérebros de indivíduos maduros. A constatação da relativa perda de
plasticidade do sistema nervoso de mamíferos adultos levou a um grande
interesse pela relação entre os fenômenos plásticos e aqueles que determinam o
desenvolvimento ontogenético normal do Sistema Nervoso. Outro aspecto da
neuroplasticidade provém dos trabalhos de alteração de propriedades
fisiológicas dos neurônios dos sistemas sensoriais, mediante a manipulação de
condições ambientais.
No plano morfológico, inúmeros trabalhos de alterações
celulares, dendríticas e principalmente axônicas, têm sido descritos. Em tais
estudos, várias teorias foram desenvolvidas para explicar como o Sistema
Nervoso submetido a lesões destrutivas é capaz, em determinadas condições, de
recuperar as funções anteriormente perdidas.
Teoria da Re-representação Hierárquica: criada
por J. Hughlings Jackson (1950), diz que cada grupo funcional do Sistema
Nervoso estaria organizado verticalmente em níveis ascendentes de complexidade
crescente.
Teoria da Diásquise: criada
por Von Monakow (1913), diz que uma lesão focal destrutiva do Sistema Nervoso
provocaria, além da perda funcional devida à região definitivamente destruída,
teríamos uma espécie de choque ou depressão funcional em regiões relacionadas à
zona de lesão. O déficit observado logo após a lesão dever-se-ia à associação
dos sintomas devidos à destruição tissular com aqueles devidos a diásquise.
Entretanto, esta desapareceria, voltando ao normal o funcionamento das regiões
deprimidas. É interessante para explicar a evolução temporal do quadro clínico
que sucede as transecções medulares (choque espinhal).
Sharpless e Goldberger (1912) explicaram tratar-se do
fenômeno conhecido como hipersensibilidade de denervação; órgãos efetuadores
ligados ao sistema nervoso autônomo quando denervados tornam-se menos
específicos e mais sensíveis aos neurotransmissores e outros agentes químicos,
após uma fase inicial de depressão funcional.
Doutrina de Substitucionismo (equipotencialidade): essa
teoria originou-se de Munk e Lashley (1944), propõe que após a lesão outras
regiões do Sistema Nervoso assumem a função atingida, "substituindo"
a região destruída, onde o fator mais importante que determinaria a evolução
temporal dos déficits resultantes de lesões seria "a quantidade" de
tecido atingido.
Reorganização Hodológica:
defendida por Cajal (1928), com novos estudos de Lin e Chamber (1943), diz
haver uma reorganização estrutural após lesões destrutivas devido à
identificação de potenciais pré-sinápticos de maior amplitude, a ocorrência de
brotamento colateral das fibras do Sistema Nervoso, onde não são os axônios
lesados que "regeneram" e sim os poupados pela lesão, aumentando ou
reorientando o telodendro de modo a ocupar o espaço terminal vago da lesão. Em
alguns casos demonstrou-se que os axônios lesados são capazes de restabelecer a
inervação de uma estrutura denervada, desde que esta se localize nas
proximidades da lesão. No entanto, em nenhuma dessas ocasiões, pôde-se
demonstrar a funcionabilidade das novas conexões formadas. Só em 1978 (Schneider)
ocorreu evidência que a reorganização hodológica de um cérebro lesado tinha
conseqüências funcionais, ainda que mal adaptativas. Neste período surgiu uma
visão geral acerca de quais mecanismos e fatores influiriam sobre a população
de axônios em crescimento, possibilitando o estabelecimento de uma via neural.
Várias sugestões foram propostas, incluindo a orientação das
fibras em crescimento segundo as linhas de força de campos elétricos, ou
segundo as linhas de tensão mecânica provenientes do crescimento e dobraduras
do tecido nervoso, ou ainda segundo gradientes químicos de substâncias capazes
de "atrair" os cones de crescimento dos axônios. O mais provável é
que todas desempenham uma parte da função de orientar os axônios em crescimento
em direção a seus alvos.
Posteriormente, surge a pergunta de como se estabelecem
precisas relações topográficas entre a população pré-sináptica e os respectivos
alvos pós-sinápticos. Neste caso, a postulação de alguns fatores que operam
nesta construção do acoplamento deve-se a evidências obtidas de sistemas
plásticos, como a competição pelos sítios pós-sinápticos, onde as duas
populações de axônios em crescimento estabelecem interações competitivas pela
"conquista" do espaço terminal disponível em que cada axônio possui
um volume de arborização pré-terminal, quando uma parte dessa arborização é
destruída, a perda é compensada por brotamentos que ocorrem em outros pontos do
axônio. Fatores mecânicos, pelos quais a disposição terminal dos axônios em
crescimento pode ser desorganizada por distúrbios mecânicos do tecido-alvo.
Fica claro, o pressuposto de que os fenômenos plásticos
decorrentes da lesão podem ser utilizados para explicar aqueles que ocorrem
durante o desenvolvimento ontogenético normal. Através de estudos recentes dos
mecanismos básicos da reorganização, sabemos que com a plasticidade neural
podemos restabelecer a função da parte perdida e/ou injuriada, sendo os
processos microscópicos que tomam parte da plasticidade neural: a) inibição
prioritária das conexões imediatamente após a lesão; b) “sprouting” local,
tanto de axônios comprometidos quanto de axônios vizinhos, o que leva à
formação de novas sinapses corretas e incorretas. Este "mecanismo de
reparação" ou “brotamento de axônios” ocorre principalmente nos nervos
sensitivos-motores.
Estudos recentes mostram uma rápida regeneração da parte
periférica do Sistema Nervoso. Existe, após uma lesão, uma degeneração
momentânea do coto distal do nervo, cujo contato com o corpo celular foi
interrompido, enquanto a bainha de mielina nas redondezas e o envoltório do
nervo permanecem conservados. Do coto proximal, que ainda está ligado ao corpo
celular, vários prolongamentos delgados brotam e crescem para dentro da bainha
de mielina, ocupando-a como um canal guia, para que possam encontrar novamente
seu local final no músculo ou em órgão dos sentidos.
No caso do nervo não ter sido totalmente comprimido ou
distendido, o crescimento dos axônios ocorre ao longo das bainhas corretas de
mielina. No caso de secção total do nervo, pode ocorrer um crescimento de
axônios através de bainhas incorretas de mielina e, dessa forma, esses axônios
podem encontrar alguns órgãos-alvo indesejados. O processo acima descrito é
observado na periferia. Já na área central, em diferentes estruturas corticais
e sub-corticais observa-se que o crescimento de células lesadas, bem como a sua
regeneração, não ocorre tão facilmente quando se trata de longas distâncias.
Na parte central do Sistema Nervoso, estruturas de
direcionamento (bainha de mielina) são organizadas de maneira complexa e
heterogênea, o que poderia levar, em distâncias muito grandes, a um erro de
contato. Aqui, também se observa tanto “sprouting” das células lesadas quanto
das não-lesadas, mormente nas vizinhanças da lesão, o que significa que tanto
os neurônios intactos do sistema funcional afetado quanto neurônios de outros
sistemas estão envolvidos nesse processo. No núcleo rubro, fibras oriundas do
córtex cerebral e do cerebelo fazem conexões. Após uma lesão periférica,
constata-se que a estimulação da região cortical vinculada a essa periferia não
consegue mais desencadear reações musculares. Decorridas, entretanto, algumas
horas após a lesão observam-se novamente reações motoras pós-estimulação da
referida área cortical. Conclui-se que o córtex, que ficara sem função após a
lesão, tenta, horas depois, ocupar-se do controle da musculatura vizinha.
Fatores Neurotróficos
Os contatos entre axônios e seus órgãos-alvo são de crucial
importância para a proliferação, migração, diferenciação, formação,
estabelecimento e manutenção das conexões neurais. Ainda que se saiba que os
programas genéticos possam direcionar os processos de desenvolvimento do
Sistema Nervoso, deve ser lembrado que as interações com o meio, mesmo no
período embrionário, resultam em mudanças nas estruturas nervosas centrais, e
que a falta de certas interações podem alterar padrões normais de
desenvolvimento.
Determinadas substâncias químicas produzidas pelos tecidos
têm a capacidade de promover a divisão celular durante o desenvolvimento
enquanto outras são essenciais para a sobrevivência de células nervosas
(fatores neurotróficos = alimento), participando das interações entre os
neurônios e seus alvos.
Hamburger e Rita Levi-Montalcini (1960), demonstraram que a
morte de células nervosas é um fenômeno natural durante o desenvolvimento do
Sistema Nervoso, pois durante a formação deste há, inicialmente, uma produção
excessiva de células nervosas que, gradativamente, começam a morrer; onde esta
fase de morte neuronal coincide com a época em que os axônios começam a
estabelecer contato com seus próprios órgãos-alvo. Sabe-se hoje que este
processo de "superprodução" neuronal, seguido de morte celular,
ocorre em todas as regiões do Sistema Nervoso Central e periférico, tendo sido denominada
de morte neuronal natural.
Em colaboração com o bioquímico Seymor, Levi-Montalcini
(1960), iniciou a purificação da substância química responsável pelo
crescimento axonal, que passou a ser denominada Fator de Crescimento Nervoso.
Três papéis importantes são considerados em relação ao FCN: 1º) sobrevivência
neuronal, 2º) extensão de prolongamentos, 3º) diferenciação de neurônios.
O mecanismo básico de ação do FCN é ser produzido por
células-alvo, ligando-se a receptores dos terminais axonais sendo internalizado
e transportado até o corpo celular, onde participa da ativação metabólica
neuronal. Essa ação é importante tanto na renovação das estruturas celulares
como na sobrevivência celular, e em fenômenos plásticos. Evidentemente, a
interrupção do transporte retrógrado desse fator bloqueia seu efeito,
resultando na morte de neurônios dele dependentes.
Em 1989, Leibrock e colaboradores descobriu um novo fator
neurotrófico a partir de extratos cerebrais, denominado Fator Neurotrófico
Derivado do Cérebro (FNDC). Nota-se que FNDC tem seus neurônios responsivos
projetando-se para o Sistema Nervoso Central, enquanto aqueles responsivos ao
FCN se projetam para a periferia. O FNDC é produzido, no Sistema Nervoso
Central, por células da glia e por neurônios, contrastando com o FCN que, na
periferia, é produzido, em condições fisiológicas, somente por células-alvo, e
por células de Schwann, após trauma de nervos. A partir dos anos 90, outros
fatores foram descobertos, com a “Neurotrofina 3” (NT-3) e o “Fator de Crescimento
de Fibroblastos” (FGF-Fibroblast Growht Factor).
Após estes estudos sempre surge a pergunta: Por que esses
fenômenos regenerativos do Sistema Nervoso Central, ocorridos em experimentos
com animais, não são observados na prática clínica, no tratamento de doenças
degenerativas ou traumáticas, tanto do Sistema Nervoso Periférico como do
Sistema Nervoso Central?
Quando ocorre lesão no tecido nervoso, quer seja traumática
ou vascular, há morte imediata dos neurônios ali localizados. Aproximadamente quatro
dias após o trauma, ocorre extensão da área primária de lesão, e neurônios
localizados perifericamente relacionados com esta área lesada também degeneram.
No local da lesão há intensa proliferação de células da glia (reativa), que
formam um bloqueio que dificulta o crescimento dos axônios em regeneração em
direção aos seus alvos originais. As fibras que permanecem intactas apresentam
um brotamento compensatório e ocupam os territórios sinápticos vagos, onde as
fibras que não atingem seus alvos antigos acabam degenerando ou formando
conexões não vistas antes da lesão. Portanto, quando comparamos os dados do
desenvolvimento do Sistema Nervoso Central com dados obtidos após o trauma,
observamos uma sequência semelhante, cuja prioridade é isolar a área lesada com
a formação de uma membrana pioglial, completando-se a invasão de vasos no
tecido nervoso. Ocorre a formação de uma barreira hemato-encefálica e
hemato-liquória, para isolar o parênquima nervoso do resto do sistema vascular.
Após a formação dessas duas barreiras, os neurônios migram para seus lugares
definitivos, devido a fatores tróficos e, por último, há neoformação de
sinapses (sinaptogênese).
É evidente que vários pesquisadores e empresas de
biotecnologia continuam suas pesquisas sobre fatores tróficos para ofertar ao
Sistema Nervoso condições para uma reorganização e retomada das funções
perdidas ou prejudicadas. Contudo, já podemos concluir que a mudança daquele
conceito de "sistema nervoso estagnado e imutável” muda, para um
neuro-universo cada vez mais responsivo, dinâmico e plástico.
Sobre o Autor:
Referências:
Publicado em 25 Abril 2012
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Fonte: http://artigos.psicologado.com/neuropsicologia/neuroplasticidade-humana#ixzz2DyGSUwuJ
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