segunda-feira, 6 de agosto de 2012

DIFERENÇAS ESTRUTURAIS E SINTOMÁTICAS ENTRE NEUROSE E PSICOSE
SEGUNDO A PSICANÁLISE
Barbosa, Isabela M. R1.; Dias, Marta R. 2
; Moya, Clara I.S. 3
1 Universidade Camilo Castelo Branco- Pós Graduanda em Tecnologia Assistiva
Rodovia Presidente Dutra, km. 138- São José dos Campos- SP, Brasil
isabela_mrb@hotmail.com
2 Psicóloga Clínica/Av. Brasil, 772- Sumaré – Caraguatatuba – SP, Brasil
11674-000 Fone: +55 12 3882 5543, Fax: +55 12 3882 5543
martarodriguesdarocha@hotmail.com
3 Universidade do Vale do Paraíba- Faculdade de Ciências da Saúde
Av. Shishima Hifumi, 2911- Urbanova, São José dos Campos(SP)
claramoya@terra.com.br
Resumo- A introdução conceitua o psiquismo humano, a psicose e a neurose segundo a teoria psicanalítica
e discorre sobre o objetivo do trabalho, que consiste basicamente em apresentar as diferenças estruturais e
sintomáticas entre neuroses e psicoses de acordo com teorias psicanalíticas. O presente trabalho foi
realizado a partir de revisão bibliográfica em textos e artigos científicos sobre o tema proposto. Os
resultados apresentados mostram as diferenças conceituais existentes entre neuroses e psicoses segundo
a Psicanálise, em aspectos distintos, como formações patológicas, etiologia, características principais e
sintomatologia. A discussão debate as idéias encontradas na literatura, comprovando as diferenças
existentes entre os componentes principais dos grandes grupos de transtornos mentais, a neurose e a
psicose, em todos os aspectos já citados anteriormente de acordo com a Psicanálise. A conclusão do
trabalho mostra que existem grandes diferenças entre neuroses e psicoses, seja nos aspectos estruturais,
seja nos aspectos sintomáticos, a partir de teorias psicanalíticas estudadas.
Palavras-chave: transtornos mentais, psiquismo humano, psicanálise, psicose, neurose
Área do Conhecimento: Ciências da Saúde
Introdução
Segundo Jorge (2005) a psicanálise é uma
experiência que, ao contrário de hipnotizar o
sujeito, visa revelar aquilo que já o hipnotiza desde
sempre, desde sua própria constituição. Lins
(2007) remonta sobre as teorias freudianas para
definir as três estruturas que compõem o
psiquismo humano: id, ego e superego. O Id é
considerado um reservatório de energia instintiva,
ou seja, é regido pelo princípio do prazer, e a partir
dele se derivam as demais estruturas. O ego
representa o princípio da realidade e segue as
normas sociais pré-estabelecidas para realizar
suas necessidades. O superego é representada
pela consciência, e refere-se à estrutura da
personalidade atingida pelos padrões culturais na
qual o sujeito está inserido.
Segundo Shaaffer e Flores (2005) para a
psicanálise, a psicose é normalmente abordada
em contraposição à neurose, apesar de ser
corrente na literatura que uma não é o avesso da
outra. Estudos definem a psicose como um
processo deteriorativo das funções do ego, que
pode comprometer, em graus variáveis, o contato
do indivíduo com a realidade. Logo, é possível
entender a psicose como um distanciamento do
ego (a serviço do id) da realidade, com predomínio
do id (e não o princípio da realidade) sobre o ego
em si (LINS, 2007). Para a psicanálise, a neurose
se origina de uma luta do ego, que posteriormente
continua no id, a fim de recalcar um impulso
proveniente deste, que contradiz com os princípios
do ego e do superego. A partir daí surgem
representações substitutivas que se impõe ao ego,
constituindo o sintoma. Logo, o ego continua a
lutar contra o sintoma, e está então constituído o
quadro neurótico.
Estudos lacanianos afirmam que cabe à
psicanálise teorizar a clínica da psicose para além
do registro simbólico, e permitir assim a distinção
da clínica da neurose da clínica da psicose. Afirma
ainda que, como referência inicial para tal
teorização, deve-se considerar a relação do sujeito
com a realidade e a forma como discorre essa
relação em ambas as clínicas. Freud (1924) apud
Teixeira (1999) descreve a diferença estrutural
entre a neurose e a psicose como: a neurose é o
resultado de um conflito entre o ego e o id, ao
passo que a psicose é o desfecho análogo de um
distúrbio semelhante nas relações entre o ego e o
mundo externo.
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X Encontro Latino Americano de Pós-Graduação – Universidade do Vale do Paraíba
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O presente trabalho tem por objetivo discutir
algumas diferenças estruturais e sintomatológicas
existentes entre transtornos do tipo neurótico e
psicótico de acordo com as teorias psicanalíticas
abordadas.
Material e Métodos
O presente trabalho foi realizado a partir de
revisão bibliográfica de textos e artigos científicos
sobre o tema proposto. Os materiais foram
consultados em rede eletrônica da seguinte forma:
pesquisados através das bases eletrônicas
“Google Acadêmico Beta”, “Literatura Latino-
Americana e do Caribe em Ciências da Saúde/
Lilacs” e “Scientific Eletronic Library Online/
Scielo”, a partir das palavras chaves neurose,
psicose, transtornos mentais, psicanálise, e
foraclusão, entre os meses de março à julho de
2009.
Resultados
A partir dos estudos de Correa (2005),
Herrmann (2004), Lacet (2004) e Teixeira (1999),
e dos conceitos estudados, pode-se diferenciar a
psicose da neurose em vários aspectos, tais
como:
-formações patológicas: de acordo com Teixeira
(1999), a neurose está diretamente ligada ao
recalque do inconsciente, ou seja, este é o
resultado de repressão do ego sobre o material
confinado no id (material recalcado). Já a psicose,
de acordo com a teoria freudiana origina-se do
mecanismo de foraclusão e se constitui de uma
retirada de libido enviada pelo ego, em que há um
refluxo da libido em direção ao próprio sujeito. De
acordo com estudos lacanianos a foraclusão
consiste na rejeição do significante do ‘Nome-do-
Pai’ para fora do registro do simbólico (fracasso da
substituição materna pela paterna). Segundo
Chassot [200-?] a metáfora ‘Nome-do-Pai’
representa a transição da criança de assujeito a
sujeito, quando o pai é investido de atribuição
fálica como pai simbólico pela mãe. Quando o
‘Nome-do-Pai’ não substitui o significante do
desejo da mãe, cria-se uma dificuldade no acesso
ao Simbólico. Considerando a psicose “portadora
de uma falha simbólica estrutural, a noção de
suplência, nesse momento, pode ser entendida
como algo que metaforiza a função paterna
foracluída” (LACET, 2004).
- quanto à etiologia: a psicanálise freudiana
acredita que a neurose desencadeia-se pela
tentativa de recalque do inconsciente, proveniente
de um conflito entre o ego e o id. Já a psicose é o
resultado de um conflito entre o ego e o mundo
externo. Segundo Teixeira (1999), há ainda muita
controvérsia a respeito da psicose, sua origem,
percurso e sobre a possibilidade de haver ou não
uma predisposição para ela.
-características principais: Para De Waelhens
(1990) apud Teixeira (1999) a neurose é
caracterizada pelo distanciamento da realidade, já
que o indivíduo neurótico tem dificuldade em lidar
com a realidade de seu meio, enquanto a psicose
é caracterizada pela perda da realidade, onde o
indivíduo passa a seguir as normas instituídas
pela realidade subjetiva que ele mesmo criou, e
não mais pela realidade objetiva que rege o meio
em que vive. Para Lacan (1955-1956/1985) apud
Hermmann (2004) “na neurose, é no segundo
tempo, e na medida em que a realidade não é
plenamente rearticulada de maneira simbólica no
mundo exterior, que há no sujeito fuga parcial da
realidade, incapacidade de enfrentar essa parte da
realidade, secretamente conservada. Na psicose,
ao contrário, é realmente a própria realidade que é
em primeiro lugar provida de um buraco, que o
mundo fantástico virá em seguida cumular.”
Também as características recorrentes em relação
ao pensamento são distintas, uma vez que,
segundo as teorias psicanalíticas a ‘clivagem do
eu’ se faz diferente na psicose e na neurose. O
termo ‘clivagem do eu’ está relacionado a uma
divisão do eu, diante circunstâncias específicas,
em duas correntes opostas. Uma dessas correntes
é capaz de acatar a realidade, enquanto outra não
é capaz de assumi-la. Assim, “que com respeito a
uma determinada conduta subsistam, na vida
psíquica da pessoa, duas posturas diversas,
contrapostas e independentes entre si, eis um
traço universal da neurose; só que, neste caso,
uma pertence ao eu, e a contraposta, como
recalcada, ao isso” (FREUD (1940a/1993) apud
VERZTMAN, 2002). Quando, porém, uma das
correntes (a que nega a realidade) supera a
oposta, há a eclosão da psicose. De acordo com
Verztman (2002) a ‘clivagem do eu’ se resume em
dois grupos psíquicos distintos, onde o sujeito
pode reconhecer uma imagem assumida como
representante privilegiado de si e alcançar a
vivência pré-reflexiva do sentimento de existência.
Sobre as características afetivas, é possível
afirmar que para a psicanálise de Freud a teoria
do “afeto” possui característica paradoxal, uma
vez que o autor defende a idéia de afetos
inconscientes, ao mesmo tempo que esboça uma
definição que consiste em vincular a existência de
afetos à consciência. Os estudos psicanalíticos de
Freud e Lacan sobre afetos iniciaram-se na
compreensão da manifestação histérica. Isso
porque o sujeito histérico reconhece seu afeto
mais verdadeiro como ilusório e nesse sentido,
suspeita de seus próprios afetos. A teoria
lacaniana apreendeu quatro afetos distintos: a
alegria e a tristeza, inicialmente, e a felicidade e o
tédio, posteriormente, e relacionou-os a
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capacidade de saber do sujeito em vincular seus
afetos ao gozo. Correa (2005) afirma que na
histeria e na neurose obsessiva há uma relação
entre saber e gozo e na psicose essa relação é
externa e excluída. Para a psicanálise não se
chega ao saber onipotente, mas somente até onde
o sujeito pode saber. O que lhe parecia impotência
(de vinculá-lo ao gozo) é desvelado como sendo
da ordem do impossível. Partindo desses
princípios, é possível dizer que o sujeito psicótico
não é capaz de denominar os afetos vivenciados,
ou seja, normalmente, não há exposição de
sentimentos por parte dos psicóticos à situações
diversas. Na neurose estes aspectos não
aparecem com seriedade.
-sintomas: a psicanálise, principalmente a teoria
lacaniana, utiliza a lingüística como forma de
analisar o discurso do neurótico e do psicótico.
Teorias lacanianas afirmam a obrigatoriedade de
presença de distúrbios na ordem da linguagem
quando diagnosticado uma psicose. Segundo
Czermark (1991) apud Shaaffer e Flores (2005) o
discurso do sujeito psicótico apresenta
características específicas, como: uso excessivo
das negações; aliado a um querer saber; um
querer demarcar um lugar e não poder fazê-lo; a
dualidade (associada ao uso reiterado das
negações). O sujeito psicótico não possui
capacidade de simbolização, e seu discurso tornase
vazio de significações. De acordo com a teoria
de Lacan o real só pode ser definido em relação
ao simbólico e ao imaginário. Por tal motivo, o
psicótico apresenta distúrbios de caráter
diferenciados nas leis de simbolização:
Verdichtung, onde há coexistência de vários
sentidos numa mesma fala; Verdrangung, onde
instaura-se o recalque de fala; Verneinung, onde a
fala é articulada simbolicamente. Segundo
Herrmann (2004) pode-se afirmar que uma
estrutura clínica se define a partir do modo pelo
qual o sujeito articula/define/ordena a sua posição
de sujeito em relação ao jogo dos significantes. Na
neurose, o sujeito habita a linguagem, ao passo
que, na psicose, o sujeito é habitado pela
linguagem. Quando não há significação fálica no
sujeito psicótico, e não há operação das leis de
simbolização, o psicótico se utiliza das palavras
numa tentativa de burlar as leis do símbolo
(LACET, 2004). De acordo com as teorias
lacanianas a diferença sintomatológica básica
entre neurose e psicose se dá, sendo ambos
“mártires do inconsciente”, na projeção do
discurso, uma vez que, o psicótico faz o seu
testemunho de forma explícita, enquanto o
testemunho do neurótico se faz de forma
encoberta.
Discussão
Os resultados apresentados nos mostram que
há diferenças essenciais entre transtornos
psicóticos e neuróticos segundo a Psicanálise.
Sobre a formação patólogica, é possível
distinguir os dois tipos principais de transtornos
mentais a partir de teorias psicanalíticas, que
propõe essa alteração no psiquismo humano ideal,
que podem posteriomente vir a desencadear
reações patológicas. Enquanto há um
distanciamento da realidade na neurose
(recalque), encontramos uma fuga de realidade na
psicose (foraclusão).
Quanto à etiologia dos transtornos
mentais, a psicanálise acredita que a psicose se
origine de um recalque do real e do processo de
investimento narcísico do eu, enquanto a neurose
se origina de um recalque do ego contrapondo-se
ao instinto proveniente do id. Isto é, a diferença
básica entre neurose e psicose se faz pelos
fatores conflitantes. Enquanto na psicose o conflito
ocorre entre ego e mundo externo, e a defesa
investida contra as representações intoleráveis se
faz através da rejeição, na neurose o conflito
acontece entre ego e id, e a defesa investida
contra as representações intoleráveis se faz
através do recalque.
É possível então entender a distinção das
características principais de neurose e psicose, já
que a partir da negação da realidade o indivíduo
psicótico não é mais capaz de desempenhar seus
papéis sociais adequadamente, pois só consegue
compreender como realidade a sua própria
realidade subjetiva. Enquanto isso, a neurose
proporciona ao sujeito neurótico apenas um
distanciamento da realidade, mas este é capaz de
reconhecê-la, tanto que o sofrimento advém da
dificuldade de aceitá-la e vivenciá-la, e a sua
existência torna-se insuportável.
As características referentes ao
pensamento se diferem, uma vez que, a clivagem
do eu no indivíduo neurótico ocorre através da
subsistência de duas posturas distintas na vida
psíquica deste, que se contrapõem, mas permitem
um equilíbrio natural na realidade objetiva do
indivíduo, já que a neurose proporciona apenas o
recalque da realidade. No transtorno psicótico a
clivagem do eu ocasiona a perda de identidade do
indivíduo psicótico, vinculada diretamente ao
desligamento deste com a sua realidade objetiva.
Quanto ao quesito afeto, para a
Psicanálise, ainda que ambos os transtornos
mentais derivem-se da compreensão do conceito
de histeria, a diferença básica entre neuróticos e
psicóticos se dá a partir da indiferença e
impossibilidade do sujeito psicótico quanto a
compreensão e experienciação de seus
sentimentos, enquanto o sujeito neurótico
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compreende seus afetos e é capaz de usá-los em
proveito próprio.
Os sintomas retratam claramente
características básicas de diferenciação entre os
dois tipos de transtornos mentais aqui estudados,
quanto ao discurso do sujeito. Enquanto o
psicótico se faz dominado pela linguagem, o
neurótico traduz a linguagem. Sendo o discurso
delirante uma tentativa de cura por parte do
psiquismo humano às reações anormais, o
psicótico expõe sua fala de forma aberta e vazia
de simbolizações, enquanto a fala do neurótico se
faz de forma implícita e encoberta.
Conclusão
O presente trabalho nos permite concluir a
partir dos resultados apresentados, que há
grandes diferenças entre neuroses e psicoses,
seja nos aspectos estruturais, seja nos aspectos
sintomáticos, a partir de teorias psicanalíticas
estudadas.
Analisando os transtornos mentais do tipo
neurótico e psicótico, de acordo com as teorias
psicanalíticas abordadas, podemos concluir que a
neurose trata-se de um conflito entre as instâncias
do ego e o id do psiquismo humano, e provoca um
mecanismo de recalque do inconsciente do sujeito
neurótico, proporcionando a este uma distorção e
consequente distanciamento da realidade objetiva,
enquanto a psicose trata-se de um conflito entre a
instância do ego do psiquismo humano e o mundo
externo, e provoca um mecanismo de foraclusão
dos significantes do inconsciente, provocando ao
sujeito psicótico a rejeição de sua realidade
objetiva e consequente criação de uma realidade
própria, desta vez, subjetiva. A diferenciação das
características e sintomas de tais transtornos
acontecem, uma vez que, o sujeito neurótico
compreende sua realidade objetiva, seus afetos e
pensamentos, e é capaz de vivenciá-los, de tal
forma que os sintomas normalmente não
aparecem com seriedade, enquanto o sujeito
psicótico se faz plenamente alheio à realidade
objetiva e não é capaz de compreender nem
vivenciar seus afetos e pensamentos, provocando
sua auto vulnerabilidade para o desencadeamento
de sintomas mais explícitos e severos.
Referências
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lacaniana dos processos psicóticos. Trabalho
apresentado na disciplina de Psicopatologia I.
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Psicanálise e Psicopatologia. Universidade
Federal do Rio Grande do Sul, [200-?]. Disponível
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Psicanálise, Rio de Janeiro, nº 28, pág. 61-68.,
setembro de 2005.
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Fund., v. IV, n. 3, p. 67-88, 1999.
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despertar: sonho, fantasia, delírio, ilusão. Ágora,
Rio de Janeiro, v. VIII n. 2, p.275-289, jul/dez
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Hermmann, M. C. O real na psicose. Instituto de
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USP, São Paulo, v.15, n.1-2, p.243 à 262-
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X Encontro Latino Americano de Pós-Graduação – Universidade do Vale do Paraíba
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- SHAAFFER, M; FLORES, V.N. O que fala o
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psicose. Aletheia, Canoas, n.22, dez. 2005.
- TEIXEIRA, T. S. Delírio, fantasia e devaneio:
sobre a função da vida imaginativa na teoria
psicanalítica. Rev. Latinoam. Psicopat. Fund., v.
IV, n. 3, p. 67-88, 1999.
- VERZTMAN, J.S. O observador do mundo: a
noção de clivagem em Ferenczi. Ágora, Rio de
Janeiro, v.5, n.1, jan/jun 2002.

A neurose do excesso de informação

O Excesso de Informação - A Neurose do Século XXI
Dr. Ryon Braga
Chegou o fim de semana. Terei para ler três imensos jornais de domingo e uma pilha de revistas de marketing, de
management, de publicidade, de informática, de variedades e de educação, além de todo o clipping do setor educacional,
acumulado durante a semana. Trouxe para casa cinco livros novos que comprei esta semana, para se juntar às dezenas de
outros livros que estão, há meses, na fila de espera para serem lidos. Passei na locadora e aluguei dois filmes imperdíveis,
que todos já viram, menos eu. Além disso, pretendo colocar em dia os mais de 100 e-mails atrasados, que estão aguardando
resposta. Tem ainda uma festa de aniversário da família para ir, os slides de duas palestras para preparar e um espetáculo
teatral excelente que, é claro, já está nos últimos dias na cidade.
Este é um típico final de semana em minha vida, mas, tenho certeza, soa familiar à grande parte das pessoas que estão lendo
este artigo. Ele faz parte dos “efeitos colaterais” da chamada Era da Informação – uma era em que a quantidade de
informação disponível e acessível pegou a todos nós de surpresa. Não estávamos preparados para ela. Antes, as pessoas não
sabiam que não sabiam. Agora, sabem que não sabem, e isso, num mundo competitivo e predatório, gera uma sensação de
frustração e incapacidade que, aos poucos, vai se transformando em uma ansiedade cada vez maior.
A Questão da Informação
Definição
Para Shanon, autor do livro “A teoria matemática da comunicação”, informação é tudo aquilo que reduz a incerteza. Partindo
dessa premissa, o que vivemos hoje não poderia ser definido como a Era da Informação, uma vez que temos uma explosão de
dados e fatos que, isoladamente, não têm significado e não produzem compreensão. Sem isso, não reduzem a incerteza e,
portanto, passam a ser “não-informação”.
Utilidade
Se o indivíduo não consegue desenvolver mecanismos de coletar e transformar dados e fatos em informação, de nada vale ele
ter acesso a miríades de fontes desses dados. Ao contrário, é possível que essa enxurrada de não-informação que ele tem
acesso ou recebe diariamente, acabe dificultando ainda mais sua tarefa de transformar tudo isso, primeiro em informação útil,
e depois em conhecimento aplicado.
Aplicabilidade
Outra questão pertinente quanto à utilidade da informação é a capacidade do indivíduo em dar aplicabilidade a ela. É muito
comum encontrar pessoas matraqueando, de forma tecnicamente correta, um repositório de informações sobre como se faz
para resolver determinada situação e, no instante seguinte, mostrarem-se totalmente ineptas para aplicar suas soluções em
um contexto mais elaborado. Em uma simples analogia com a pedagogia convencional vemos que, mesmo nas escolas mais
bem “sucedidas”, observa-se que a maioria dos bons estudantes (freqüência assídua, notas altas e o reconhecimento dos
professores) não demonstra uma compreensão adequada dos conceitos que aprenderam na escola. Eles falham em resolver
problemas que são formulados de maneira ligeiramente diferente daquela em que foram formalmente instruídos e testados.
O Excesso de Informação
Quantidade
Ninguém duvida dos benefícios que a tecnologia da informação tem proporcionado a todos. Acessar, em tempo real,
informações sobre quase tudo que existe no mundo e poder estabelecer contato direto com as fontes de informações,
representa uma drástica mudança de paradigma na sociedade humana. Por outro lado, o maior acesso à informação tornou
visível a parte “submersa do iceberg” – há informação demais e tempo de menos.
O excesso de informação pode ser percebido através da grandiosidade dos números que os fatos nos mostram:
- Mais de 1.000 novos títulos de livros são editados por dia em todo o mundo;
- Uma só edição do jornal americano The New York Times contém mais informações do que uma pessoa comum recebia
durante toda a sua vida há 300 anos (Revista Veja de 05 de setembro de 2001);
- Atualmente existem mais de três bilhões de páginas disponíveis na Internet;
- Estão em circulação mais de 100 mil revistas científicas no planeta;
- Há 15 anos a Televisão brasileira tinha menos de 10 canais. Hoje tem mais de 100 e, daqui a 10 anos, estima-se, terá mais
do 400 canais.
Acesso
Para que possamos entender melhor a questão do excesso de informação vamos verificar um exemplo prático e real. Se um
estudante universitário que sabe ler apenas em português e inglês, resolve realizar uma pesquisa aprofundada sobre o tema
crianças hiperativas, irá deparar-se com a seguinte quantidade de informações:
- 178.820 páginas na Internet (até 30 de julho de 2003);- 6.884 artigos científicos publicados nas revistas da área da saúde
nos últimos 12 anos;- 4.748 artigos científicos publicados em revistas da área de educação nos últimos 10 anos;
- 1.387 artigos e matérias de jornais e revistas informativas (só em português), publicados nos últimos cinco anos;
- 557 livros (sendo 32 em português e o restante em inglês).
Mediante estes números, não é preciso muito esforço para perceber que, se o estudante não estiver preparado para o trato
com a informação, tenderá a ficar extremamente ansioso, sem saber por onde começar seu trabalho.
Armazenamento
O armazenamento da informação também contribui para o problema da ansiedade. Para a editora da revista eletrônica Mundo
Digital, Maria Ercília, está acontecendo uma inversão de paradigma no nosso relacionamento com a informação. “Nossa
capacidade de produzi-la era contida e disciplinada pela dificuldade e pelo custo de publicação, transmissão e arquivamento.
Hoje o que acontece é exatamente o contrário: esses custos caem mais depressa do que podemos acompanhar.” Se não
estamos gastando muito espaço nem dinheiro para guardar algo, acabamos não jogando fora - e gerando uma pilha de dados,
que se torna inútil pelo seu próprio volume absurdo. Muitas pessoas têm informações armazenadas em CD, disquetes e no HD
do computador que, se impressas, não caberiam em suas casas.
O Excesso de Informação na Mídia
Dispersão
O excesso de informações em forma de textos técnicos, análises, críticas, opiniões, interpretações superficiais, ao invés de
embasar o conhecimento e auxiliar a tomada de decisão, acaba causando uma dispersão do conteúdo informacional que pode
gerar conclusões mal fundamentadas e decisões equivocadas.
Supérfluo
Segundo o jornalista André Azevedo, o excesso de informação na mídia pode estar causando um relativismo absoluto nas
concepções humanas ou um “sentimento de impotência, que costuma levar o indivíduo à apatia, ao conformismo, ao cinismo
ou mesmo niilismo - pois a constelação de informações inviabiliza a hierarquia de valores do receptor, impossibilitando-o de
avaliar o que é de fato fundamental e o que é supérfluo”.
Para Azevedo, “as futilidades circulam ao lado de grandes questões da humanidade com idênticos formatos, espaços editoriais
e repercussão. A notícia importante desaparece, encolhida sob a multiplicação infinita de fofocas sobre celebridades,
rusguinhas teatrais entre políticos, declarações oficiais, etc. O viciado em informação precisa saber tanto sobre a nova
tecnologia de aparelhos de mp3 quanto o resultado do campeonato mundial de ping-pong, tanto sobre as oscilações da bolsa
em Kuala Lumpur quanto à nova safra de desenhos animados do Cartoon Network, independente da necessidade real de saber
tais coisas”.
Revistas
Diante deste cenário, as revistas segmentadas que souberem realizar o papel de coletar, selecionar e contextualizar a
informação, dentro das necessidades de seu público-alvo, deverão ser as mais bem sucedidas nesta era do excesso de
informação.
Ansiedade de Informação
Segundo Richard Wurman, autor do livro “Ansiedade de Informação”, este é o resultado da distância cada vez maior entre o
que compreendemos e o que achamos que deveríamos compreender.
Com medo de ficar desatualizado e na busca de acompanhar as miríades de teorias preconizadas pelos “gurus” do
conhecimento, muitas pessoas começam a desenvolver sentimentos de ansiedade e frustração, em conseqüência da
incapacidade de absorverem toda a quantidade de informações que julgam necessárias.
Para a psiquiatria, a ansiedade surge em conseqüência da superestimulação que não pode ser descarregada por meio da ação.
No caso da ansiedade de informação, ela pode resultar tanto do excesso como da carência de informação. O que conta para a
gênese da ansiedade é como nos sentimos perante a informação ou a falta dela.
Há um círculo vicioso comum para todos aqueles que ficam ansiosos na busca de informações. Quanto mais informações
obtêm, mais ficam sabendo da existência de novas fontes da mesma informação, gerando ainda mais ansiedade.
É comum as pessoas se sentirem intimidadas e impotentes frente à quantidade enorme de informações existente à sua volta,
e buscarem, portanto, mais e mais informações na vã tentativa de suprir suas inseguranças.
O problema é que tais sentimentos de impotência agravam os sintomas de ansiedade que, por sua vez, reduzem a capacidade
de aprender, gerando mais ansiedade e fechando o círculo vicioso.
O mal-estar começa com a sensação de que tudo está acontecendo mais rápido do que se consegue assimilar. Executivos
costumam ficar angustiados pensando que os outros estão obtendo mais informações, lendo mais livros, lendo os livros e
revistas certos, utilizando softwares melhores, enquanto eles estão ficando para trás em suas carreiras.
Segundo Wurman, são várias as situações que costumam provocar ansiedade de informação: não compreender a informação;
sentir-se assoberbado por seu volume; não saber se uma certa informação existe e; não saber onde encontrá-la.
O excesso de informação como elemento de dissociação cognitiva
Manter a capacidade de se concentrar e fixar a atenção, selecionando os estímulos e informações que interessam, tornaramse
os grandes desafios desta era do conhecimento.
A tentativa de apreender muitas informações ao mesmo tempo prejudica a capacidade de fixação mnemônica dessas
informações e, conseqüentemente, a consolidação do aprendizado.
A nossa capacidade de reter e consolidar estímulos e informações é limitada, mas nossa percepção não. Isso possibilita que a
pessoa se ocupe com várias coisas ao mesmo tempo, mas com perda da capacidade de processar adequadamente o que está
fazendo.
Nossa percepção do mundo é simultânea, mas nossa ação é seqüencial; se a pessoa não estabelecer prioridades não
conseguirá ter um bom desempenho.
Não são apenas as informações provenientes de livros, revistas, jornais e dos websites que estão causando ansiedade e
problemas. Os e-mails e os telefones celulares começam a entrar no rol dos elementos potencialmente nocivos ao bom
desempenho cognitivo dos profissionais ansiosos.
E-mails
Os e-mails, que representam um marco sem precedentes na facilitação da comunicação humana à distância, estão se
tornando um elemento que rouba muito tempo e gera ansiedade nos profissionais mais suscetíveis.
Recentes pesquisas mostraram que um executivo norte-americano recebe, em média, de 35 a 120 e-mails diários,
dependendo da função e tipo de atividade que exerce. Tomando como base 50 e-mails diários, pelos menos 35 deles são de
informações inúteis, repetitivas ou não solicitadas (spams). Estima-se que o executivo gaste de 45 a 60 minutos de seu tempo
diário com esse tipo de e-mail.
Celular
Já o telefone celular, importante elemento de facilitação da comunicação just-in-time, também tem se mostrado, nas mãos
dos mais ansiosos, um causador de dissociação cognitiva.
Conforme explica Renato Sabattini, neurocientista da Unicamp, quando toca o celular e a pessoa interrompe repetidamente
uma tarefa que estava realizando, isso automaticamente inibe os circuitos cerebrais que estavam sendo formados para que a
informação fosse decodificada. Ao iniciar outra atividade, como falar ao celular, o cérebro vai ter que formar um novo circuito.
Esse vai-e-vem, que é muito desgastante, pode causar lapsos de memória e dificultar a absorção e o processamento das
informações que estavam em curso.
Deixar-se levar pela avalanche de informações é uma das fontes de danos ao cérebro. Mas não a única. Não concluir as
tarefas começadas pode ser muito pior. Atualmente, o telefone celular passou a ser um dos principais elementos geradores de
permanentes interrupções nas atividades dos executivos.
A Síndrome do Excesso de Informação
A Síndrome do Excesso de Informação ainda não é uma doença. Considerada isoladamente, ela faz parte dos componentes do
stress associado ao trabalho. Mesmo assim, ela já começa a apresentar características próprias.
Na medida em que a ansiedade no trato com a informação vai crescendo, o nível de stress vai subindo, com conseqüências
mais graves para o nosso organismo. Começa com desordens do humor, com o aumento da irritabilidade e continua com a
dificuldade para adormecer, distúrbios da memória até chegar a níveis elevados de stress e desenvolvimento de um
comportamento neurótico.
É importante ressaltar que a origem do problema está na incapacidade das pessoas em lidar com o excesso de informação e
não, obrigatoriamente, na quantidade de informações.
Profissionais, pressionados por chefes, gurus, consultores e outros mais, vivem tendo a sensação de que não se sentem
capazes de assimilar todas as novidades em sua área, nem de lidar com todas as informações que recebem. O sentimento de
obsolescência profissional é o que predomina.
Não satisfeitos em curtir sozinhos suas angústias, muitos profissionais acabam passando essa ansiedade para seus filhos. Já
estão se tornando comuns depoimentos como o do jovem Ricardo Zalem, de 15 anos, que freqüenta um colégio de ensino
médio, estuda inglês e espanhol, pratica voleibol, faz academia e tem aulas semanais de informática e violão. “Eu só queria
ter tempo para fazer mais coisas, queria que a semana tivesse 10 dias e que o dia tivesse 36 horas”, diz Ricardo, já candidato
aos efeitos da síndrome.
Processos de degeneração precoce da memória, que antes só apareciam em pessoas com mais de 50 anos, agora, passam a
ser encontrados em pessoas com idade entre 20 a 40 anos. Especialistas do Grupo de Estudos em Linguagem da USP
acreditam que tal fato se deva ao excesso de informações e estímulos que bombardeiam nosso cérebro diariamente. São
informações cada vez mais rápidas, provenientes dos meios de comunicação, do telefone celular e, principalmente, da
Internet. O problema acomete principalmente executivos e profissionais workaholics, que precisam estar sempre bem
informados.
Um dos principais sinais de início da síndrome é quando você começa a demorar muito para se "desligar" das atividades
diárias mesmo quando está fora delas. Exemplo: em casa, no final de semana, na companhia da família ou diante da TV, você
não consegue tirar da cabeça o relatório que faltou fazer, o livro que gostaria de ter lido no fim de semana e não leu ou
aquele dado do gráfico da companhia que não ficou bem compreendido.
Tomada de Decisão
Outra seqüela do excesso de informação é a dificuldade na tomada de decisão. A imensa quantidade de informações
disponíveis para tomar como base cada vez que precisa decidir sobre algo, faz com que o indivíduo sinta-se, cada vez mais
inseguro na hora de tomar decisões. Ele fica com a sensação de que ainda poderia obter mais algumas informações que lhe
dariam mais embasamento. Além de tudo, o tempo para reflexão vai ficando cada vez mais escasso, cedendo lugar para o
tempo gasto na absorção de mais e mais informações.
Para Richard Wurman, a tomada de decisão vai se tornando mais crítica na medida em que aumenta o volume de
informações, porque muitas pessoas encaram as decisões com apreensão, uma vez que elas implicam em eliminar
possibilidades.
A tomada de decisão, por sua vez, está profundamente relacionada com a capacidade de realização prática ou efetiva de algo.
Talvez seja por isso que o indeciso tenha baixa capacidade de realização. Deve advir desse fato o dito popular que fala que se
você reunir cinco intelectuais em torno de um projeto prático, terá tantos “senões” e considerações que dificilmente
conseguirá concretizá-lo.
Neologismos da Era do Excesso de Informação
Cybercondríacos
É a versão digital dos hipocondríacos. São pessoas que pesquisam os sinais e sintomas de determinadas doenças na Internet
e passam a acreditar que a possuem. O pior é quando pesquisam sobre o tratamento e passam a se automedicar.
Dataholics
Termo criado pelo professor Sabbatini da Unicamp, que serve para designar as pessoas que são “viciadas em informação”.
São pessoas que só se sentem seguras após lerem a mesma informação em quatro ou cinco fontes, para checar a veracidade
da mesma.
Bulimia Informacional
Termo que caracteriza a necessidade compulsiva pela coleta de informações, cada vez em maior quantidade, geralmente de
forma pouco criteriosa. O bulímico informacional não se preocupa com a qualidade da informação da qual “se alimenta”, mas
sente uma imperiosa necessidade de ficar sabendo de tudo o que se passa nas áreas em que atua.
Obesidade Informacional
Resultado da bulimia informacional, nesse caso, a obesidade refere-se ao excesso de informação desnecessária ou pouco
relevante, que ao se acumular, prejudica a efetivação do aprendizado relativo às informações que realmente seriam úteis ao
indivíduo.
Lemos muito, mas aprendemos pouco
A busca, seleção e leitura de informações deve ser precedida pelo estabelecimento de objetivos bem definidos. Ou seja, antes
de ler qualquer coisa você deve responder as seguintes perguntas:
- Por que eu estou lendo este texto?
- Para que servirão estas informações?
- Qual o significado dessas informações no meu contexto de vida ou profissional?
- Como e com o que posso associar estas informações de forma a compreendê-las com mais profundidade?
- Como posso dar aplicabilidade prática a estas informações?
No mínimo, as respostas a essas perguntas nos ajudariam a organizar nosso tempo e nosso processo de aprendizagem. Mas
também poderá ajudar a dar a noção de sentido e prioridade ao que fazemos, de forma que, certamente, passaremos a rever
a quantidade e a qualidade das informações que processamos.
A leitura de qualquer tipo de informação deve ser sucedida por um período de reflexão quanto ao significado do material lido.
O processo de reflexão exige análise, associação, contextualização e síntese, de forma que ele pode proporcionar não só a
criação de conhecimento original, como também auxilia o processo de fixação mnemônica do conteúdo.
Sem isso, teremos a sensação de estarmos “absorvendo” muito, mas na verdade, estaremos aprendendo pouco.
Cosmograma
O Cosmograma, técnica desenvolvida pelo pesquisador brasileiro Waldo Vieira, é um excelente instrumento de auxílio ao
pesquisador, no que se refere ao trato com a informação.
Vieira define o Cosmograma da seguinte maneira: “O Cosmograma é a planilha técnica para determinação valorativa das
realidades do universo através da associação máxima de idéias (visão de conjunto)”.
A utilização da técnica do Cosmograma proporciona ao pesquisador obter uma mega-síntese da realidade pesquisada, através
do entrecruzamento de informações e análise minuciosa dos fatos. O Cosmograma permite:
- Compreender a interdisciplinaridade dos fatos cotidianos;
- Ampliar a visão de conjunto dos fenômenos existenciais;
- Aumentar a criatividade, obtida através da acumulação de achados (informações); somada ao processo de correlacioná-las
sucessivamente (associação de idéias);
- A identificação da essência por trás de fenômenos específicos.
Como Trabalhar o Excesso de Informação
- Admita para você mesmo que você será um eterno aprendiz. Nunca poderá nem precisará saber de tudo;
- Lembre-se sempre que você não precisa saber tudo, mas somente como encontrar o que precisa. O mais importante, então,
não é acumular informações, mas aprender a localizá-las e inseri-las em um contexto que faça sentido prático (aplicabilidade).
Vale mais saber como localizar e selecionar as informações sobre determinado assunto do que tentar saber tudo sobre ele.
Quando você realmente precisar deste conhecimento, você pode construí-lo com rapidez;
- Aprenda profundamente como funcionam os princípios e métodos de organização das informações, para poder extrair delas
valor e significado. Descubra como a estrutura da informação está organizada (num livro, numa revista, num jornal ou na
Internet), isto é a chave para a correta busca e seleção da informação;
- Compreenda que grande parte dos textos e sites na Internet dizem a mesma coisa com outras palavras;
- Sempre estabeleça limites na busca de informações (cronológico e quantitativo);
- Procure aprender os melhores critérios de seletividade. Não leia as informações provenientes de boas fontes. Leia apenas as
de fontes excelentes. Priorização é a chave;
- Procure associar sempre idéias e conceitos com fatos. Desta forma, a recuperação da informação será sempre mais fácil;
- Ao invés de ler sempre todas as notícias e fatos que lhe interessam, recorte-os e guarde em uma pasta, separando-os por
assunto. Quando uma pasta, sobre determinado assunto, tiver mais do que 50 recortes, leia-os todos de uma vez. Com isso
você aprenderá a ter mais visão de conjunto, associar informações com mais facilidade, e então, você descobrirá o tempo que
você perdia lendo a mesma coisa em vários lugares diferentes ou com outras palavras;
- Também é importante saber quem são as pessoas-chave que poderão ajudá-lo a integrar e contextualizar as informações
quando você precisar;
- Procure concluir as tarefas que começou. Cada vez que você abandona uma atividade para fazer outra (pára de ler um email
para atender ao telefone, por exemplo), o seu cérebro interrompe a construção de circuitos neuroniais necessários àquela
atividade para iniciar outra. Isso promove o esquecimento da primeira tarefa e exige mais energia do cérebro.

Compreensão psicanalitica da psicossomatica

Zeno Germano– zenoneto@tjro.jus.br
Psicólogo dos Juizados Especiais Criminais do Poder Judiciário do Estado de Rondônia.
Doutorando em Psicologia pela Universidad de Ciencias Sociales y Empresariales/Argentina
Resumo
Este artigo tem o objetivo de trabalhar com a compreensão psicanalítica da psicossomática a partir do tratamento possível na clínica. Traz as conceituações dos autores que criaram as condições, desde Freud, para que se possa pensar o fenômeno hoje e tenta-se apresentar as características que marcam a direção do tratamento da psicossomática naquilo em que ela se diferencia da neurose.
Palavras-chaves: Psicossomática, Psicanálise, corpo, clínica, fenômeno.
Introdução
Nas últimas décadas do século XX, o uso do termo “psicossomática” passou a ser freqüente tanto no meio médico e psicológico quanto no meio da comunidade científica, sendo que também já não era novidade no seio das sociedades psicanalíticas, que desde as manifestações conversivas da histeria anunciadas por Freud no início do pensamento psicanalítico, colocam os analistas diante da lida com a questão do adoecimento do e no corpo.
Entretanto, mesmo se configurando como tema assíduo entre os analistas e tendo uma literatura relativamente abundante, é preciso cada vez mais reconhecer que a psicossomática é um terreno ainda com aspectos misteriosos e de contornos imprecisos, o que leva os pesquisadores do fenômeno a necessidade de aprofundar constantemente seus conceitos.
A Problemática da psicossomática: delimitando o campo.
Para se ter uma visão geral atual da psicossomática, vamos nos remeter aos estudos tanto de cunho psicanalítico quanto os oriundos do discurso médico, a chamada medicina psicossomática. Nicolau (2008) enfatiza que, apesar de mudanças que passaram a ocorrer no saber médico no século XX, quando a medicina passou
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cada vez mais a inserir a dimensão humana como fator decisivo para a compreensão das enfermidades, os médicos de modo geral continuam a associar o diagnóstico de uma doença a seu correlato orgânico. Escreve Nicolau (2008);
(...) no campo da medicina, quando não se encontra um referente orgânico da doença, o diagnostico fica essencialmente associado aos tipos clínicos decorrentes dos sintomas apresentados, abordando o tratamento das enfermidades psicossomáticas como uma patologia que se manifesta equitativamente. Assim, diante de uma lesão de órgão ou de uma dor que não se inscreve no discurso médico, são comuns os diagnósticos de “distúrbios neuro-vegetativos”,” stress” ou” doença psicossomática” e os pacientes já vem com um diagnóstico previamente estabelecido. (p.964).
A autora ainda cita que mesmo que o paciente não chegue a ter um diagnóstico pré-estabelecido, já ficam rotulados pelo médico; - “Você não tem nada. Vá ao psicólogo.”.
Fonseca (2007) escreve sobre a atenção que a Medicina passou a dar ao fenômeno, principalmente com o desenvolvimento das pesquisas sobre o câncer, e ao mesmo tempo, que tipo de demanda passa a ser construída a estes pacientes psicossomáticos;
Fonseca (2007) afirma;
(...) pesquisas importantes tem sido publicadas como a do Departamento de Saúde Pública da Universidade de Helsinque com 10.808 mulheres portadoras de câncer de mama admitindo que (...) “os eventos da vida e as reações psicológicas que os acompanham podem também aumentar o risco de câncer de mama” (...) e concluindo que o stress causado por fatores psíquicos pode interferir no aumento ou diminuição de secreção de vários hormônios e acelerar o desenvolvimento do câncer. Médicos, enfermeiras, assistentes sociais, profissionais psi, dedicam-se ao cuidado desse tipo de paciente, ás vezes chamado de “psicossomático”, que talvez seja o mais difícil que se apresenta para o tratamento, pelo fato do seu “mal” resistir aos cuidados que lhe são dispensados. (...) sua demanda é geralmente dedicada ao médico numa tentativa de certificação da causalidade física e principalmente, de uma terapêutica salvadora que lhe resgate a saúde e até mesmo a vida. (p.96)
Não resta dúvida de quanto inegável é a contribuição do campo da medicina psicossomática para a ampliação e revelação da complexidade deste fenômeno, o que
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inclusive serviu para apontar questões a serem investigadas pela Psicanálise. No campo médico é necessário elaborar e assimilar para a compreensão da psicossomática, as descobertas mais recentes da biologia molecular e da neuroimunologia, por exemplo. Neste aspecto ressalta-se a necessidade de refletir sobre os processos de que dependem estes sintomas em seus registros tanto somáticos quanto psíquico na singularidade de cada sujeito.
No adoecimento somático, o corpo passa a ser a grande referência daquele que sofre. A enfermidade que se apresenta ao analista, muitas vezes já nomeada pelo saber médico, regula a vida e os pensamentos do paciente. Este revela assim uma dificuldade muito grande em se desvencilhar, em dar novo sentido a seu sofrimento. Ai se pode perceber as barreiras para que estes pacientes possam se analisar, pois dificilmente conseguem subjetivar seu sofrimento, investindo constantemente na dimensão corporal.
Nicolau (2008) levanta questionamentos importantes para a Psicanálise; Que escuta oferecer quando a queixa se concentra no órgão doente ou na dor?
Como intervir nestes casos? Serão eles, invariavelmente, abordados a partir de um modelo pré-estabelecido e catalogados como somatização ou doença psicossomática? Como explicar esses fenômenos do ponto de vista do sujeito nele implicado? Qual a direção do tratamento quando este não vem pela via da implicação do sujeito com sua dor? (p.963)
Portanto, percebemos com a autora que há muito para se refletir sobre a clínica com pacientes portadores de distúrbios psicossomáticos, que caso se limite apenas aos fenômenos em si correria o risco de reduzir o sujeito a sua dificuldade.
A Psicanálise, com sua escuta dirigida á singularidade de cada sujeito, não aceita o deslocamento do sentido para o da causalidade, nem vai transpor uma causalidade orgânica em causalidade psicológica, pois em sua origem não se limita ao viés “médico-funcional”, nem focaliza o sintoma para estabelecer diagnósticos.
Mas, o que diz a Psicanálise sobre os processos e desdobramentos que conduzem á enfermidade psicossomática?
Na obra de Freud, as formulações que mais se aproximam do que se conhece atualmente como psicossomática estão em sua definição de neuroses atuais. Freud
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(1895/1987) mencionou um grupo de neuroses de transferência que se assemelham ás afecções psicossomáticas denominando-as neurose atuais e classificando-as em neurastenia e neurose de angustia. A neurastenia tinha origem na satisfação sexual realizada de forma inadequada e nas neuroses de angustia, o sujeito não obtém uma descarga de excitação sexual, produzindo angustia diante da relação sexual incompleta.
Em 1912, Freud sustenta que as neuroses atuais deveriam ser pensadas de forma diferente das psiconeuroses (histeria, fobias e neuroses obssesiva-compulsiva); “A prisão de ventre, as dores de cabeça e a fadiga do chamado neurastênico não admitem serem remontadas histórica ou simbolicamente, a experiências operantes, e não podem se compreendidas como substitutos da satisfação sexual ou como conciliações entre pulsões, como é o caso dos sintomas psiconeuróticos.” (Freud, p. 314).
Freud (1915) ainda trabalha outros conceitos que estão relacionados com a questão do corpo. No artigo “Sobre o Narcisismo; Uma introdução” menciona a distribuição, os destinos da libido e articula á doença orgânica, á hipocondria e ás neuroses atuais. No mesmo ano, em “Pulsões e seus destinos”, introduz a noção de prazer do órgão como modo de satisfação auto-erótica, parcial e sem objeto externo, onde a excitação se encerra no órgão próprio onde começou.
Importante salientar ainda que Freud, ao pensar sobre o corpo, acabou por desenvolver o conceito de conversão somática, que seria uma junção do psíquico e do físico remetendo a outra cena. Freud denominou conversão a uma manifestação somática idêntica ao desejo em que está em jogo uma satisfação substitutiva de uma fantasia de conteúdo sexual e onde esta outra cena fala do sujeito através de seu corpo.
Lacan (1954-1955/1985) trabalha a diferença entre o sintoma neurótico e o fenômeno psicossomático quando diz que o primeiro está enquadrado pela estrutura narcísica, visto que se acha organizado na relação com o outro enquanto o fenômeno psicossomático aparece como resultado do investimento da libido no interior do corpo.
Se o sintoma neurótico se encontra na identificação possível com o outro, o fenômeno psicossomático aparece como resultado do investimento sobre o órgão e não sobre um objeto, ou seja, é uma manifestação da pulsão em forma pura, ficando o órgão lesionado fora da constituição imaginária do eu. Podemos então, com Lacan,
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falar em curto-circuito na montagem pulsional onde o que entra em jogo na relação com o outro é o órgão, imagem especular do próprio corpo.
Lacan entende a psicossomática como fenômeno e não como sintoma na medida em que esta não comporta a intermediação simbólica, em uma aproximação direta com fenômenos psicóticos como o delírio.
No seminário “Os quatro conceitos fundamentais da psicanálise” (1964-1965/1988), Lacan refere-se ao desejo do Outro, dizendo que o fenômeno psicossomático é fruto da indução significante, onde o desejo do Outro não aparece no sujeito como falta, sendo um desejo inquestionável que aponta para a falha do simbólico, um desaparecimento ou afânise, onde o sujeito aparece sempre representado por outro significante. Lacan (1964-65/1985); “A psicossomática é algo que não é significante, mas que, mesmo assim, só é concebível na medida em que a indução significante, no nível do sujeito, se passou de maneira que não põe em jogo a afânise do sujeito.” (p.215-216).
Esse fenômeno é resultado do fracasso do recalcamento primordial, ou seja, da marcação do Nome-do-Pai. Não há barra que incida e faça separação entre os significantes (Lacan os nomeou então significantes holofraseados). Assim, quando ocorre a “gelificação” da cadeia significante, pode se produzir não apenas a psicossomática, mas também a psicose.
Aqui podemos entender porque diversos teóricos lacanianos fazem aproximação entre a psicossomática e a psicose, principalmente porque Lacan apresentou uma série onde inclui a psicose, a debilidade mental e a psicossomática como resultante da holófrase, uma lógica que aponta para o congelamento dos significantes.
Guir (1988) conclui que o fenômeno psicossomático diz respeito a uma falha na função da Metáfora Paterna resultado de uma arranhadura na operação de castração; “O problema de fundo do fenômeno psicossomático é este: a metáfora paterna funciona em certos sítios do discurso e não em outros. Somente alguns momentos específicos do discurso provocam um desencadeamento no corpo.” (Guir, 1988, p.49).
Já Nasio (1993) afirma que o fenômeno psicossomático corresponde a uma formação do objeto a e não a uma formação do inconsciente. A doença estaria do lado das alucinações e da passagem ao ato, onde o Nome-do-Pai não se mantém, não oferecendo consistência ao sujeito.
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Seguindo a linha de pensamento lacaniana, podemos pensar que quando o sujeito está petrificado pela doença, seu corpo se torna fonte ilimitada de gozo, apontando para um corpo onde, ao contrário da histeria de conversão, a palavra está como que desertada, não havendo uma escrita legível. Dizendo de outro modo, faltam palavras ao sujeito em psicossomática, daí percebe-se a carência e impossibilidade de associação livre em seus discursos e o investimento intenso no corpo, marcas também da diferença entre analisar um neurótico e um paciente psicossomático.
Dentre as demais idéias consideradas importantes no campo psicanalítico que tentam explicar a psicossomática estão as de Alexander, Grodeck, McDougall e a Escola Psicossomática de Paris onde se destacam Marty e M’Uzan.
Alexander (1952) postulou a idéia de que um “simbólico” estaria ausente na formação dos transtornos somáticos. Segundo este autor, a doença é conseqüência de emoções, impulsos não satisfeitos, desviados e reprimidos em um efeito direto dos afetos sobre o corpo.
Godreck (1991) defendeu a idéia de que o Id é o criador e todas as doenças, sendo estas originadas de um desejo, portadoras, portanto, de um sentido.Para ele, o adoecer orgânico é regido pelo processo primário e pelos mecanismos de deslocamento e condensação.
Para Marty e M’Uzan (1994), percebe-se no paciente psicossomático a pobreza da associação subjetiva, dificuldade no estabelecimento da transferência, limitação das capacidades simbólicas e carências de elaboração fantasística.
Marty (1993) aponta comportamentos automáticos e adaptativos, uma ruptura com o inconsciente e com a sexualidade, alienação da própria história, negligencia do passado e incapacidade de projeção para o futuro, o que Marty denominou Pensamento Operatório.
Ás dinâmicas afetivas específicas destes pacientes, Marty (1966) denominou Depressão Essencial, que diferente do que se percebe na depressão neurótica, no luto ou na melancolia, não denota nenhum trabalho de elaboração, uma depressão sem objeto que se constitui na essência mesma da depressão.
Já para McDougall (1983), existe a vinculação dos transtornos psicossomáticos á primeira infância, por isso estes pacientes não podem utilizar palavras como veículo diante do sofrimento. McDougall constrói uma definição do que acontece na psicossomática que ajuda a estabelecer sua diferença em relação á histeria e
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consequentemente á neurose. McDougall (1983) sustenta que essa explosão no corpo, que não é uma comunicação neurótica nem uma restituição psicótica, tem uma função de ato, de descarga, que provoca um curto-circuito no trabalho psíquico.
O curto-circuito que postula McDougall é importante então para estabelecer a diferença fundamental para a clínica psicanalítica entre psicossomática e a neurose. No fenômeno psicossomático não pode surgir o trabalho psíquico, a elaboração, em uma linha que se afasta consideravelmente do que postulou Godreck, por exemplo, e se alinha aos pensamentos conceituais propostos por Lacan, que já havia pensado a compreensão de um curto-circuito no aparelho psíquico.
Outro autor que merece referência é Dejours (1988). Este psicanalista francês aprofunda questões ligadas ás somatizações e ao pensamento operatório e constrói a hipótese da terceira tópica apoiado na idéia de uma dupla clivagem do sujeito, na qual, por um lado, se desenvolveria uma relação mediada pelo recalcamento e pelo pré-consciente e por outro, uma relação entre o “inconsciente primitivo” contido pela própria consciência e pelo pensamento lógico-conceitual.
Seguindo a linha de pensamento da escola francesa, Sami Ali (1995), no livro “Pensar o Somático-Imaginário e patologia”, enfatiza as Patologias de Adaptação nos pacientes psicossomáticos. Aponta ausência quase absoluta de sonhos, de sintomas neuróticos, de lapsos, de devaneios ou de atividade criativa, pouco contato com seus desejos, uma utilização empobrecida da linguagem além, de uma aderência extrema ao factual e á realidade material.
Na esfera da América Latina, uma contribuição a ser considerada é a do psicanalista argentino David Maldavsky (1992) que propõe uma leitura da afecção psicossomática como “Afecção Tóxica” relacionando o quadro a um mecanismo de defesa específico que denomina “Desestimação do afeto”.
Este mecanismo de defesa produz a desaparição do afeto sentido e tem a ver com a forma originária do desenvolvimento da consciência no sentido de qualificar os estados pulsionais. Maldavsky aponta que existem dois tipos de excitação: As químicas e as mecânicas, estando as primeiras vinculadas a neurose atual e a segunda ás neurose traumáticas.
Para Maldavsky, as afecções tóxicas tem a ver com o modelo das neuroses traumáticas pois estas são potenciais introdutores da tendência á inércia pulsional. Há então, no início, uma consciência primordial que se constitui como condição para o
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registro dos afetos e das percepções e sensações. É o primeiro aspecto organizador do psiquismo e que nas afecções tóxicas encontra-se alterado.
Psicoterapia psicanalítica de pacientes psicossomáticos
Com a análise das histerias aprendemos que certas manifestações corporais admitem uma leitura, pois expressam um discurso. Através do sintoma, torna presentes uma ausência que mantém o sujeito em equilíbrio e evita a angústia da aproximação com o desejo, aí então, inconsciente.
Isto posto, formam um sentido que, evidenciado ao sujeito, o liberta do sintoma, sintoma este “amarrado” em uma relação simbólica, isto é, a relação entre a representação recalcada e o produto consciente, o sintoma. Assim, falamos de um corpo neurótico. Nas manifestações psicossomáticas, já entendemos se tratar de outra coisa.
Santos Filho (1992), chama a atenção para o fato de que os pacientes psicossomáticos em geral não buscam tratamento de maneira espontânea e sim foram encaminhados por um médico clínico, por exemplo, o que faz a demanda ser mal definida. O autor afirma;
Enquanto o fenômeno neurótico nos faz pensar em uma relação de qualidade, mediado pela representação significante, o fenômeno psicossomático, com seu caráter de descarga, nos sugere uma relação econômica. (...) a impossibilidade precoce de inclusão da dor psíquica numa cadeia simbólica, nomeada e articuladora, que tornaria possível de ser vivenciada, cria uma desintegração potencial na unidade psicossomática. Esta, ao ver-se ameaçada por uma perda, por exemplo, propicia o surgimento no corpo da manifestação de descarga-ato, que são os sintomas psicossomáticos. (p. 355)
Santos Filho (1992) faz também uma sintetização da psicossomática para nortear os aspectos técnicos da psicoterapia;
Admite uma diferença da histeria na medida em que no fenômeno somático não se consegue avançar pelos mesmos meios de acesso.
A via biológica admite uma história, mas é ligada a vivencias traumáticas.É uma via anatômica com seu substrato fisiopatológico.
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Relaciona-se com as noções de descarga e ato, fazendo-nos encará-la mais do ponto de vista metapsicológico econômico do que dinâmico.
Tem como correlato o pensamento operatório e a aprendizagem como meios de ligação e controle das possíveis desorganizações internas e externas, no lugar da articulação associativa simbólica.
É possível ser pensada como curto-circuito, devido á insuficiência mediadora do pré-consciente.
Como conseqüência, é melhor equacionada na primeira tópica, enquanto os processos neuróticos o são pela segunda tópica.
Relaciona-se á supressão e á clivagem do ego.
É desencadeada por um acontecimento da ordem da perda ou equivalente.
Esta perda não é relacionada pelo sujeito ao fenômeno e em geral é minimizada e “bem tolerada”.
É uma via estabelecida precocemente, geneticamente antes do advento da palavra como organizador simbólico, ou seja, se estabelece em um período pré-verbal, relacionando-se á diferenciação eu - outro, á organização do sentimento de ser e de existir. Pode ser pensada como uma via que protege, anacronicamente, o sujeito de angústias dessa época, portanto angústias de aniquilamento ou psicóticas.
Constitui-se sobre falhas nas relações primordiais, notadamente com a mãe ou substituto. (p.356)
Nas primeiras entrevistas com pacientes psicossomáticos percebe-se que estes não buscam uma subjetivação e sim uma necessidade de relação humana mais próxima, de função imaginária, que consiga minimizar a intensidade das angústias e das ameaças de desintegração. Sobre isto escreve Santos Filho (1992);
O que há de singular nestas entrevistas? Inicialmente a demanda, que é fornecida por um outro e é aceita ou “aprendida” pelo paciente. Funciona como se fosse uma receita ou pedido de exame complementar. (...) Há um pedido inicial de algo concreto, objetivo, algo que possa ser aprendido, ensinado e não desvendado, descoberto. (p.357)
Com o exposto pelo autor, não há então, o que descobrir. Notamos uma dissociação absoluta entre o acontecimento traumático e os sintomas corporais que nos leva a considerar a primeira grande ação terapêutica quando do atendimento de pacientes psicossomáticos; a reconstituição histórica como enfatiza Santos Filho (1992);
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Ai reside nossa tarefa primeira: a reconstituição histórica, a cronológica e a integração entre datas, acontecimentos e eclosões somáticas. Isso pode dar ao paciente uma primeira consciência da relação de seus sintomas com algo maior, de caráter existencial e ajudar a criar um sentido inicial e uma noção da razão de ser do tratamento. (p.357)
O mesmo autor considera importante este aspecto da reconstituição histórica também para alertar sobre como se conduz o tratamento com o paciente psicossomático. Tal perspectiva demarca ainda mais a diferença para o terreno da neurose. Escreve Santos Filho (1992);
Se o analista fica em silêncio esperando o sentido brotar das associações livres tem uma amarga surpresa. Não brota sentido. Há também o silencio, forma-se um clima de incompreensão, de surpresa, decepção e comumente interrompe-se o tratamento. Admitida esta presença viva, constante, falante, questionadora e ativa do analista como algo necessário, é fácil imaginar que esta psicoterapia deve ser conduzida face a face e não com o paciente em posição deitada. (...) O paciente psicossomático não está em Tebas, á beira de um oráculo, á espera de decifração. Ele está em busca de uma relação humana, interpessoal, que possa ajudá-lo a constituir-se mais plenamente como sujeito e, quem sabe, um dia possa até desejar buscar um oráculo. (p. 357)
Volich (1998) ciente da diferença entre a condução de análise de um neurótico e de um paciente psicossomático, defende uma visão ampla, onde somente a compreensão psicológica é insuficiente. Acredita que o fenômeno exige uma abordagem multiprofissional, devendo haver interlocução de saberes. Escreve Volich (1998);
Em função de tudo isso, a prática da psicossomática não pode se restringir a uma atividade de consultório particular. Para que estas trocas e a função de interlocução sejam possíveis, é necessário que ela seja exercida em conjunto com outros profissionais, em um contexto institucional, de saúde, de educação, e mesmo empresarial, em enquadres interdisciplinares. (p.19)
Volich (1998) também enfatiza a importância da mentalização do pensamento e dos afetos como elemento regulador essencial para uma adequada condução do trabalho terapêutico. Partindo da compreensão de uma perspectiva econômica, onde se infere que o organismo tem basicamente três vias de descargas de suas excitações, a saber, a via orgânica, a ação e o pensamento, para este autor é evidente
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qual a via usada pelo paciente psicossomático e que a mentalização é o recurso que precisa ser oferecido aos pacientes;
Compreendemos assim a função e a importância atribuída pela Psicossomática Psicanalítica ao aparelho mental, á mentalização do sujeito como reguladores da economia psicossomática. A mentalização consiste em operações simbólicas através das quais o aparelho psíquico garante a regulação das energias instintivas e pulsionais, libidinais e agressivas. A atividade fantasmática, o sonho, a criatividade são atividades essenciais ao equilíbrio psicossomático. A estruturação ou o funcionamento deficiente do aparelho psíquico traz como conseqüência a utilização de recursos mais rudimentares, da ordem da motricidade ou mesmo das reações orgânicas, como meios de regulação da energia do indivíduo. (p.15)
A mentalização se constituí então como o início de um processo de construir conjuntamente ao paciente psicossomático um acesso ao mundo simbólico que lhe falta. Neste sentido o terapeuta está na necessidade de verbalizar, de propor assuntos, de colocar questões e de responder ás do paciente, de abrir vias e caminhos que o paciente não consegue abrir sozinho.
Sabattini (2008) dentro da perspectiva psicanalítica escreve que;
El psicoanalisis há ido diferenciado um campo especifico para la afeccion psicosomatica. Para ello ha debido producir a partir de la investigacíon de los fenómenos, um cuerpo teórico novedoso, una nueva lectura diríamos de los esquemas intervenientes. Han surgido sub especialidades como la psicooncologia, la psicocardiologia, la psicodermatologia, etc.
Se consideraron desarrollos de otras ramas de la salud y también de la psicología de la salud. Tal el concepto de vulnerabilidad psicosomática. Podríamos decir que se ha hecho hincapié en lo temprano del desarrollo evolutivo que es hacia donde confluyen las problemáticas del narcisismo, y dentro de ellas, la psicosomática. Lo temprano y su vehículo, la díada primiaria, requiereron de mayores presiciones. (p.14)
Assim, o desenvolvimento das intervenções psicanalíticas no terreno do fenômeno psicossomático está atrelado a toda uma gama de estudos que inevitavelmente remete á compreensão dos vínculos objetais primitivos da criança, aquilo que já se sabe relacionadas á fase pré-verbal. Neste sentido outros psicanalistas como Bion e seu conceito de revérie materna, Winnicott e a função de
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holding e Spitz e a função materna introjetada, estudos voltados basicamente para a díade mãe-filho, tornam-se requisitos essenciais.
Considerações Finais.
Fica evidente que a direção do tratamento com pacientes psicossomáticos traz a necessidade de pensar a diferença do fenômeno em relação á neurose. Se nos pacientes neuróticos a “interpretação simbólica” tem o efeito sutil de por a mostra um sentido oculto, desconhecido para o paciente tal como uma metáfora, não vemos a mesma possibilidade com os pacientes psicossomáticos.
A interpretação, tal qual a entendemos para a psicanálise de neuróticos, deve ser evitada no trabalho com psicossomáticos. Como nestes pacientes, sua condição se estabelece em uma fase pré-verbal, fica fácil imaginar a fragilidade pessoal com a qual lidamos a realizar a análise com eles. Daí a compreensão de que não é de um oráculo que eles precisam em terapia e sim de algo que se aproxime mais de uma relação interpessoal.
Assim, estas psicoterapias acabam por exigir muito mais do analista. Exigem tempo maior, paciência e uma disponibilidade interior de se colocar nesta posição que em muito difere da posição diante do neurótico.
Os pacientes psicossomáticos relacionam-se mais com as disposições verdadeiras, reais do analista como pessoa. Muito mais do que com as palavras que o analista diz, embora seja por meio das palavras do analista, em sua forma claramente sugestiva, que o paciente terá alívios em momentos de maior angústia.
Deste modo, será através do pré-consciente do analista que se poderá organizar a capacidade simbólica do analisando. Ao analista caberá colocar as palavras que faltam ao paciente e por meio das suas características pessoais, ofertar uma relação de suporte e construção para o psiquismo do paciente. Enfim, um trabalho árduo, lento e cuidadoso, no qual, mais do que em qualquer outro trabalho analítico, a intuição e os afetos do analista e não sua inteligência forma o norte para se alcançar alguma transformação em um fenômeno que insiste em se dar em um único lugar: o corpo.
REFERÊNCIAS
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Title
Psychosomatic clinic (psychoanalytical considerations)
Abstract
This article aims to works over the psychoanalytical comprehension of psychosomatic from the possible treatment at the clinic. It brings some conceptions from the authors who created such conditions, since Freud, in order to enable some thoughts about this phenomenon nowadays, and also tries to show the features which determine the direction of psychoanalytical treatment of the psychosomatic on what it distinguishes from neurosis.
Keywords
Psychosomatic, psychoanalysis, body, treatment, phenomenon.
http://www.faar.edu.br/revista
Recebido em: 12/11/2010
Aceito em : 16/11/2010