sexta-feira, 10 de agosto de 2012

Psicol. USP vol.11 n.1 São Paulo  2000
http://dx.doi.org/10.1590/S0103-65642000000100003 
DIAGNÓSTICO ESTRUTURAL DE PERSONALIDADE EM PSICOPATOLOGIA PSICANALÍTICA

Tânia Maria José Aiello Vaisberg1
Maria Christina Lousada Machado2
Instituto de Psicologia - USP


Este artigo apresenta o diagnóstico estrutural de personalidade como prática clínica fundamentada na Psicopatologia Psicanalítica Estrutural. As concepções de Bleger, Bergeret e Winnicott são articuladas visando oferecer subsídios teóricos para o estabelecimento de tal diagnóstico, cuja finalidade principal é orientar decisões clínicas quanto à escolha de técnicas e estratégias psicanalíticas adequadas ao tipo de psicopatologia envolvido em cada caso particular. Procedimentos Projetivos, utilizados transicionalmente nas entrevistas clínicas, são especialmente mencionados, uma vez que possibilitam o acesso, num contexto lúdico e criativo, aos determinantes lógico-emocionais subjacentes às condutas humanas.
Descritores: Psicopatologia. Psicanálise. Psicodiagnóstico. Desenvolvimento da personalidade. Técnicas projetivas.


"Tenho de tomar por certa a compreensão e a aceitação da análise da psiconeurose. Baseado nesta presunção, digo que, nos casos que estou examinando, a análise começa bem e progride com ímpeto; o que está acontecendo, contudo, é que o analista e o paciente estão se divertindo em conluio em uma análise psiconeurótica, quando, na realidade, a enfermidade é psicótica. (...) Na realidade, o avanço não foi um avanço, mas sim um novo exemplo de o analista jogar o jogo que o paciente faz de postergar a questão principal." (D. W. Winnicott. "O Medo do Colapso").
Observa-se, na prática psicológica corrente, direta ou indiretamente influenciada pelo pensamento psicanalítico, certa tendência a desvalorizar o diagnóstico da personalidade. Esta tendência tem importantes conseqüências, tanto do ponto de vista da eficácia clínica como da ética, na medida em que o desconhecimento das condições psicopatológicas pode resultar em intervenções terapêuticas ineficazes e até prejudiciais.
No entanto, desde os primórdios da psicanálise, Freud (1904/1948e) reconheceu a importância do estabelecimento de um diagnóstico provisório antes do início efetivo do tratamento. Esta preocupação manifesta-se explicitamente já em 1904, ocasião em que indica, baseado em sua experiência clínica e nos conceitos teóricos desenvolvidos até então, alguns critérios para a seleção de pacientes (p. 307). Em artigo posterior, Freud (1913/1948b) retorna a questão da necessidade de uma triagem preliminar e ratifica a necessidade de um período prévio de entrevistas para "...sondagem, e para decidir se ele é apropriado para a psicanálise," admitindo que "... existem também razões diagnósticas para começar o tratamento por um período de experiência deste tipo, a durar uma ou duas semanas" (p. 334). Naquele contexto, tratava-se sobretudo, de proceder à escolha de caso passível de ser beneficiado pela psicanálise, já que Freud excluía, nesta data (1913), a possibilidade da análise de pacientes não-neuróticos. Contudo, admitia e almejava que desenvolvimentos teórico-técnicos posteriores pudessem levar à proposição de uma psicoterapia psicanalítica das psicoses.
Pensamos que a atual desvalorização do diagnóstico da personalidade resulta de uma confusão entre os conceitos de método e técnica. Não havendo uma clara discriminação entre o método psicanalítico, que é, de fato, essencial e fundante da atividade humana denominada psicanálise, e a técnica de tratamento das neuroses, que é uma de suas aplicações, historicamente a mais antiga, muitos erros passam a ser cometidos. A desvalorização do psicodiagnóstico é um destes equívocos, cometido justamente por profissionais que pensam saber valorizar o conhecimento psicanalítico. Conseqüentemente, toda vez que se deparam com sintomatologia psicopatológica de significado emocional, deixam de proceder à realização do psicodiagnóstico para apenas indicar psicoterapia psicanalítica, como se o método psicanalítico só pudesse se concretizar através do modelo freudiano clássico de tratamento para neuróticos. Um olhar mais detido não pode deixar de perceber que, para tais profissionais, problemática psíquica de ordem emocional é sinônimo de neurose, de sorte que muito provavelmente nutrirão crenças acerca da organogênese dos distúrbios psicóticos. Uma variante, que não muda essencialmente este quadro, acontece quando pais buscam atendimento psicológico infantil. Nestas situações, o psicodiagnóstico é realizado, mas, surpreendentemente, pouco considerado pelo psicoterapeuta que vai se encarregar do caso. O objetivo deste estudo de caso parece se restringir a embasar uma "entrevista devolutiva" com os pais, cuja função principal é convencê-los a optar por uma ludoterapia. Pensamos que este procedimento é questionável tanto no âmbito epistemológico, por separar investigação e intervenção em dois momentos distintos, quanto clínico, por desconsiderar dados valiosos do ponto de vista psicopatológico que deveriam orientar uma intervenção terapêutica eficaz.
A questão do método psicanalítico tem sido pormenorizadamente desenvolvida, entre nós, por Herrmann (1979), que demonstra, de modo convincente, ser este o elemento invariante que unifica uma série de diferentes práticas as quais, rigorosamente, podem ser consideradas psicanalíticas. Concordamos com Herrmann, quando afirma que o método psicanalítico consiste essencialmente na busca dos determinantes lógico-emocionais que estruturam as condutas humanas. Desta feita, trata-se de método que pode ser utilizado em tentativas de inteligibilidade, desde a perspectiva psicológica de análise do fenômeno humano, de toda e qualquer conduta na acepção precisa com que este conceito é definido por Bleger (1977). Utilizando o conceito de conduta que se atualiza como fenômeno mental, corporal ou de atuação no mundo, Bleger adota posição epistemológica que supera o dualismo corpo-mente e estabelece uma relação dialética entre ambos. Simultaneamente, ao definir tais manifestações como essencialmente vinculares, torna inviável a desconsideração das condições concretas da existência humana, firmando, deste modo, uma visão do homem como ser essencialmente social. É interessante lembrar que o desenvolvimento destas idéias fundamentou-se na concepção de dramática desenvolvida por Politzer (1928/1929). Bleger vai, contudo, enfatizar que o drama humano é necessariamente forjado, desde tenra idade, na relação com outrem, de modo que seu significado íntimo só é susceptível de ser desvendado com base nas experiências vitais do sujeito em questão. Por outro lado, conforme ensina a psicanálise, este sentido pode permanecer inconsciente, o que requererá a aplicação do método psicanalítico ao estudo psicológico da conduta, a partir do que se pode chegar à apreensão/construção daquilo que Herrmann (1979) denomina inconsciente relativo.3
O método psicanalítico pode se concretizar por meio de diferentes técnicas, segundo os propósitos pelos quais se intenta realizar uma investigação/intervenção psicanalítica, duas facetas indissociáveis neste campo do saber. Assim, a interpretação verbal, o manejo do setting, o uso de procedimentos projetivos em psicodiagnóstico ou em pesquisa sobre representações sociais (Aiello-Vaisberg, 1995, 1996, 1997; Lousada-Machado, 1995) ou o estudo psicanalítico de produções culturais, são exemplos de diferentes modos de emprego do mesmo método. Mais precisamente, é importante lembrar que, no âmbito psicoterapêutico, o método psicanalítico deve se concretizar através de técnicas e estratégias de tratamento diferentes, segundo a psicopatologia envolvida. Quando está em pauta o sofrimento neurótico, o método se encarna segundo as modalidades interpretativas classicamente empregadas por Freud. Entretanto, deve-se recorrer a outros procedimentos técnicos quando o paciente apresenta problemáticas de origem mais regredida, comumente designadas como borderlines ou psicóticas, sendo fundamental salientar que, embora as condutas terapêuticas difiram da análise padrão, permanecem essencialmente psicanalíticas na medida em que a cura é conduzida por meio da busca dos determinantes lógico-emocionais subjacentes às condutas.
Sabemos que o conceito de cura em psicanálise é bastante complexo e polêmico, tendo em vista o arcabouço teórico desenvolvido por Freud, de modo que não nos propomos discuti-lo neste momento. Consideramos, entretanto, indispensável mencionar que, no contexto da psicopatologia psicanalítica estrutural, diferentes estruturas/organizações de personalidade apresentam angústias básicas distintas, cuja abordagem terapêutica requer técnicas diversas (Bergeret, 1974). Toda cura é empreendida, para este autor, através da busca de compensação da estrutura do sujeito, sem pretensão do alcance de transformação estrutural, já que considera que uma existência "saudável" pode ser conquistada tanto a partir de uma estruturação neurótica de personalidade, como a partir de uma estruturação psicótica.4 O mesmo, no entanto, não se pode dizer dos casos borderlines, organizações limítrofes que, a rigor, nunca estariam verdadeiramente compensadas. No entanto, da mesma forma que a estrutura psicótica, estes casos exigem estratégias de atendimento distintas da modalidade clássica, sendo, portanto, imprescindível a realização do diagnóstico da psicopatologia envolvida.5
Em resumo, se a unicidade do método for confundida com unicidade de técnica, não existirá, realmente, sentido na elaboração do psicodiagnóstico. Por outro lado, se o método psicanalítico tiver que se conformar a diferentes procedimentos técnicos e estratégias de atendimento, não poderemos abrir mão do diagnóstico. Cabe, neste momento, para dar continuidade a nosso pensamento, esclarecermos o que entendemos por psicodiagnóstico. Consiste o psicodiagnóstico na realização de discriminações que visam, primordialmente, orientar intervenções psicoterapêuticas e psicoprofiláticas. Ou seja, a nosso ver, o psicodiagnóstico só tem sentido no contexto de uma prática psicológica, pois existe um vínculo essencial entre o tipo de discriminação diagnóstica apreendida e o tipo de operação interventora que se pretenda aplicar à questão. Tanto é absurdo utilizar, na clínica psicológica, distinções que orientam outras práticas, médicas ou religiosas, como entender que outros agentes, operando a partir de diferentes perspectivas de entendimento, adotem nossas discriminações. Qualquer conclusão diagnóstica, seja psicológica, psiquiátrica ou qualquer outra, é significativa apenas no âmbito de uma certa operatividade, teoricamente orientada, postura que evita, inclusive, o uso fetichizado do diagnóstico. Sabemos que é este tipo de uso, baseado na crença a respeito da possibilidade de uma afirmação essencial sobre o ser humano, que legitima rotulações e práticas segregacionistas mais ou menos disfarçadas. Em outras palavras, considerar qualquer diagnóstico desvinculadamente das condições de sua produção resulta em duplo equívoco, ético e epistemológico, que pode gerar conseqüências humanamente lamentáveis.
De nossa parte, propomos enfaticamente a consideração do psicodiagnóstico como tentativa de apreensão de aspectos da realidade intersubjetiva a partir do reconhecimento das limitações inerentes às condições mentais humanas do pesquisador. Pensamos que esta é uma postura baseada em pretensões mais realistas, podendo resultar em maior eficácia clínica. Evidentemente, nesta concepção do psicodiagnóstico como orientação para certos tipos de intervenções, que guardam em comum o fato de sempre se realizarem em termos simbólicos, ao nível psicológico de organização do fenômeno da vida (Bleger, 1977), encontramos diferentes práticas. Apresentaremos, entretanto, a forma como temos praticado do diagnóstico estrutural psicanalítico (Bergeret, 1992), que deve lidar com uma concepção de estrutura de personalidade como "história transformada em estrutura psíquica" (Paz, 1976), uma vez que a psicanálise é um "estruturalismo genético" (Goldmann, 1974). Ou seja, estrutural, neste contexto, não significa descolado da história, mas, ao contrário, aquilo que se cristaliza a partir da história emocional infantil.
Lembramos que esta idéia é, no nosso entender, uma das mais valiosas contribuições da psicanálise, pelo fato de enfatizar a importância do ambiente, mais precisamente das experiências emocionais em tenra idade, para a formação da personalidade do ser humano. Está presente na obra de Freud (1917/1948c), em suas considerações referentes às três séries complementares, a saber, fatores hereditários e constitucionais, experiências infantis e fatores desencadeantes ou atuais, cuja interação complexa seria responsável pela etiologia das neuroses. Embora, ao desenvolver sua metapsicologia baseada na teoria pulsional, Freud tenha negligenciado, até certo ponto, o contexto concreto da existência humana, sua contribuição original permanece inestimável, justamente por maximizar o valor dos acontecimentos vitais, ou seja, nos termos de Bleger (1958), da dramática humana, para a compreensão do fenômeno psíquico.
Encarada como estruturalismo genético, a psicanálise pode ser focalizada de uma perspectiva dialética, o que, acreditamos, permite um manejo teórico interessante do conceito de estrutura de personalidade, evitando um vínculo obsessivo, sempre paralisante e pouco fecundo, com a noção de estrutura. Trata-se de uma questão fundamental, pois entendemos que ao articular as contribuições de Bleger (1958, 1977), autor que lê dialeticamente a psicanálise, e as sistematizações metapsicológicas tais como propostas por Bergeret (1974), interessantes caminhos teórico-clínicos podem se abrir. Este tipo de articulação tem, inclusive, valor didático, uma vez que facilita a leitura da psicopatologia implícita de autores psicanalíticos de estilo pouco sistemático.
Goldmann (1974) ressaltou que a psicanálise e o marxismo têm importantes pontos em comum, aqui retomados, na tentativa de melhor compreensão da noção de estrutura de personalidade, tal como nos propomos trabalhar. Afirma este autor que ambos partem da afirmação de que, no plano humano, nada existe desprovido de sentido, embora sua significação nem sempre seja aparente ou consciente. Tanto a psicanálise quanto a teoria marxista utilizam métodos de restabelecimento de sentido a partir de fragmentos em si mesmos superficialmente não significativos ou portadores de outros sentidos manifestos. Em ambos os métodos, trata-se de integrar o fragmento estudado em uma totalidade relativa mais ampla, que, segundo o caso, pode receber o nome de estrutura, vida social ou psiquismo inconsciente. De fato, qualquer fragmento estudado poderia ser integrado em estruturas diferentes, nos planos da subjetividade, da vida histórica ou da vida biológica. Finalmente, tanto para a psicanálise como para a teoria dialética, as estruturas não devem ser consideradas invariáveis ou permanentes, mas constituem o termo final de processos históricos.
À luz da psicanálise como estruturalismo genético, podemos pensar que a estrutura de personalidade é produto de uma história e é essencialmente mutável. Isto não significa, infelizmente, que a estrutura de uma personalidade seja sempre passível de mudança no plano concreto da vida, pois a temporalidade da vida humana não permite que qualquer experiência seja vivida a qualquer tempo. Ainda assim, a qualquer momento e seja qual for a psicopatologia envolvida, um atendimento psicoterápico embasado no método psicanalítico, que considere as caracte-rísticas estruturais da personalidade do paciente, pode aliviar o sofrimento psíquico e facilitar a atualização de potencialidades. Aliás, é muitíssimo importante salientar que, no nosso entender, a estrutura de personalidade deixa de ser, no plano concreto da temporalidade de cada um, mutável, porque, em última instância, ela expressa posições libidinais e localizações tópicas do sujeito, as quais, fixadas na infância, passam a se constituir como determinações. Mas o sujeito humano não se reduz, de modo algum, à estrutura de sua personalidade. É o que justamente enfatiza Bianchi (1993), dizendo que, para além da estrutura existe:
... uma zona de liberdade, uma margem de manobra do sujeito e toda diligência psicoterapêutica repousa evidentemente na possibilidade de o sujeito distanciar-se em relação às subestruturas de valência dominante (p. 67).
Na prática clínica, as estruturas podem manter-se, mas seu funcionamento pode ser transformado. Por outro lado, as organizações limítrofes podem chegar a se estruturar verdadeiramente.
Estruturas de personalidade e história individual
A psicanálise destaca-se de outros enfoques psicopatológicos na medida em que distingue o plano sintomatológico, que pertence ao registro descritivo, superficial e manifesto, do plano latente da estrutura de personalidade, que diz respeito a angústias, defesas e fantasias não diretamente acessíveis à consciência (Ionescu, 1994).
Bergeret (1974) define a estrutura de personalidade como: "... modo de organização permanente mais profundo do indivíduo, aquele a partir do qual desenrolam-se os ordenamentos funcionais ditos ‘normais’, bem como os avatares da morbidade." (p. 15), acrescentando que: "... a sintomatologia torna-se simplesmente o modo de funcionamento mórbido de uma estrutura quando esta se descompensa." (p. 10), sendo que "... o sintoma não nos permite jamais, por si só, prejulgar acerca de um diagnóstico da organização estrutural profunda da personalidade." (p. 46).
Desta feita, os sintomas são considerados de modo bastante relativizado, acreditando-se que qualquer estrutura de personalidade pode apresentar qualquer tipo de sintoma, neurótico ou psicótico, em virtude de todos os seres humanos partilharem todos os tipos de situações de ansiedade, como já apontava Freud (1926/1948a). Fundamental é o contexto de personalidade no qual o sintoma tem lugar, da mesma forma que este contexto orientará primordialmente as intervenções psicoterápicas ou psicoprofiláticas a serem desenvolvidas, com vistas a permitir a cada estrutura encontrar sua melhor realização. Não se menospreza, contudo, o valor da discriminação sintomatológica psiquiátrica, a partir da qual eventuais medidas devem ser tomadas, em caráter de urgência, para a preservação da integridade e da vida. Trata-se, entretanto, de prática que, sendo desenvolvida por outro profissional, o psiquiatra clínico, não se confunde com as intervenções psicológicas propriamente ditas, a cargo do psicoterapeuta.
Psicanaliticamente falando, pensa-se que, no plano mais profundo da personalidade, cada estrutura é produto do alcance e da realização de determinadas etapas do desenvolvimento psicoemocional. Entende-se, assim, que a estrutura psicótica seja resultado do enfrentamento de frustrações bastante precoces, numa fase da vida em que não foram suficientemente alcançadas e consolidadas a integração da personalidade, a diferenciação eu/não-eu e estabelecidas relações objetais (Winnicott, 1945/1978a). Este autor chegou, em 1948, a afirmar: "... a importância do meio ambiente é tão vital neste estágio inicial, que se chega à inesperada conclusão de que a esquizofrenia é uma espécie de doença de deficiência ambiental" (p. 294). Isto porque, conforme retoma e explicita em 1952, o sucesso destas tarefas empreendidas pelo bebê humano nos primeiros meses de vida depende, essencialmente, da presença de uma mãe suficientemente boa. Esta, adaptando-se ativamente às necessidades do bebê, oferece-lhe a oportunidade de criar ilusões acerca do mundo e de dominá-lo imaginariamente. É justamente a habilidade do bebê de usar a ilusão, aliada à disponibilidade da mãe para proporcionar-lhe esta experiência, isto é, para fornecer-lhe aquilo de que necessita na hora e no lugar certos, que tornam viável o contato entre o bebê e o ambiente. Quando o mundo não é apresentado gradativamente ao novo ser humano, possibilitando que os processos intelectuais superem paulatinamente eventuais falhas adaptativas por parte da mãe, e acontecem invasões ambientais excessivas para esta fase, ocorre uma perda do sentido de continuidade do ser e um retorno defensivo a estados não integrados, como resposta ao ambiente traumático. Esta situação vital concorre para a exacerbação de angústias de fragmentação, características do período, contra as quais o sujeito vai construir uma personalidade pré-psicoticamente estruturada ao redor do uso extensivo de determinadas técnicas defensivas.
Por outro lado, quando a criança pôde contar, em seu crescimento, com um ambiente suficientemente bom na fase de dependência absoluta, conhecendo o que Bergeret (1974) chama de evolução banal, mas encontra dificuldades de alguma magnitude em função de insuficientes ou inadequados aportes ambientais na fase de dependência relativa, ou seja, quando já alcançou certa autonomia e separatividade, a ponto de perceber a mãe como objeto total distinto de si própria, do qual, entretanto, ainda depende, um fenômeno diverso tem lugar. Trata-se da ocorrência de um trauma psíquico precoce que leva a criança, ainda despreparada emocionalmente, a ingressar abruptamente na situação edipiana dando lugar à pseudolatência. Observa-se, neste caso, uma luta constante contra angústias depressivas, isto é, relativas à perda do objeto de amor e de ódio, a qual configura o que é conhecido como organização limítrofe de personalidade, podendo esta assumir variadas formas sintomatológicas ou caracterológicas. Citando Bergeret (1974):
O ego, no caso dos estados limítrofes, superou sem frustrações nem fixações demasiado grandes o momento em que as relações iniciais e precoces muito más com a mãe teriam podido operar uma pré-organização do tipo psicótico. Este ego continua, pois, sem muitos empecilhos, seu caminho rumo ao Édipo quando subitamente, (...) esta situação relacional triangular e genital não pode ser abordada em condições normais; um fato da realidade do contexto, que em outras circunstancias estruturais não teria, talvez, o mesmo impacto significativo, é sentido pelo sujeito como uma frustração muito viva, um risco de perda do objeto; é a isto que chamarei de "trauma psíquico precoce. (p. 129, grifos nossos)
Continuando:
Este primeiro trauma afetivo ou "trauma precoce" desempenhará o papel de primeiro desorganizador (ou desorganizador precoce) da evolução do sujeito. Encontraremos, pois, esta evolução fixada, de início, e às vezes por muito tempo, em uma espécie de pseudolatência mais precoce e durável que a latência normal.(...) Este bloqueio evolutivo da maturidade afetiva do ego, no momento em que este ainda não está sexualmente diferenciado, constitui aquilo que chamei de "tronco comum dos estados limítrofes." (p. 130, grifos do autor)
Ressaltamos que Bergeret (1974) refere-se a um fato da realidade, atribuindo a responsabilidade pela perturbação no desenvolvimento emocional do indivíduo a uma falha do meio-ambiente, ou ainda, nos termos de Winnicott (1945/1978a, 1948/1978c, 1952/1978d), a um ambiente insuficientemente bom, incapaz de fornecer um holding adequado no momento em que este é necessário. Justifica-se, portanto, não só nos casos de pré-estruturação psicótica, mas também nos de pseudolatência limítrofe, a proposta de diferenciação de uma área de pesquisa e de intervenção que temos denominado de Psicopatologia da Deficiência Ambiental. Evidentemente, não queremos dizer que o ambiente deixe de ter importância na vida humana a partir da superação das fases de dependência absoluta e relativa. De fato, estamos muito longe disso, principalmente porque entendemos que o homem é, essencialmente, um ser social, vivendo sempre inserido em um ambiente humanizado. Entretanto, em termos clínicos, é importante diferenciar casos que, em virtude do grau de amadurecimento do indivíduo, caracterizem-se pela presença ou ausência de um ego suficientemente discriminado, unificado e fortalecido.
Finalmente, quando a criança lidou suficientemente bem com as tarefas emocionais características das fases de dependência absoluta e relativa, não se sobrecarregando com angústias de fragmentação ou do tipo anaclítico, pode vivenciar a situação edipiana, o que enseja uma pré-estruturação neurótica da personalidade. A neurose, forma de "adoecer" desta estrutura, origina-se "... quando a criança está começando a tomar seu lugar na família como um ser humano total" (Winnicott, 1952/1978d), em outras palavras, quando o ego está íntegro e a identificação sexual bem estabelecida. O indivíduo é impelido, então, pelo desejo sexual dirigido à figura parental do sexo oposto, desejo este inaceitável pelo superego. O sintoma neurótico expressa, portanto, o conflito entre a censura psíquica e o desejo sexual inconsciente, constituindo-se como um compromisso entre ambos. A angústia de base, reverso do desejo, é, neste caso, a de castração, que, simbolicamente implicaria na perda de acesso ao prazer, temido e desejado.
Resumindo, cada uma das estruturas pode se apresentar compensada ou descompensada, enquanto as organizações, pela sua labilidade e pelo desgaste emocional que custam, nunca estão, rigorosamente falando, realmente compensadas, ainda que possam passar por períodos de sofrimento mais ou menos agudo.
É neste sentido que Bergeret, comentando o funcionamento mental das organizações limítrofes, faz menção àquilo que Winnicott (1949/1978b, 1952/1978d, 1960/1982) designa como falso self, referindo-se, com certeza, à pseudonormalidade que tais organizações podem demonstrar à primeira vista e aludindo a elas como: "... as frágeis organizações narcisistas intermediárias (...), cuja estabilidade contenta-se em imitar (os ‘normais’ possíveis) às custas de ardis psicopatológicos variados, incessantemente renovados e profundamente custosos e alienantes. (Bergeret, 1974, p. 42).
O psicodiagnóstico estrutural psicanalítico vem a ser, portanto, a discriminação da estrutura/organização de base da personalidade, a partir da qual diferenciamos, em um primeiro momento, se estamos, ou não, diante de psicopatologia resultante, essencialmente, de deficiências ambientais, para, a seguir, diferenciarmos, excluída a possibilidade de estruturação neurótica, a magnitude e momento desenvolvimental de ocorrência da falha básica (Balint, 1933/1968). Tais diferenciações resultarão em diferentes estratégias terapêuticas, no campo mesmo da aplicação do método psicanalítico de busca dos determinantes lógico-emocionais estruturantes das condutas. Discrimina-se a estrutura/organização em pauta por meio do exame de alguns critérios metapsicológicos, a partir dos quais, segundo se supõe, esta ou aquela se configura ao longo da história e do desenvolvimento individuais. São eles: a angústia organizadora, as modalidades de relação objetal predominantes, as técnicas defensivas mais intensa e freqüentemente utilizadas e o grau do desenvolvimento egóico e pulsional. Trata-se, como é possível notar, de critérios passíveis de apreensão tão somente na relação transferencial, vale dizer, no contato intersubjetivo peculiar que o enquadre psicanalítico oferece, de modo a possibilitar produção de conhecimento sobre o analisando. Como é sabido, a compreensão e o manejo da transferência exige certa perícia por parte do profissional, resultante tanto de sua formação teórica, como de sua experiência pessoal de análise.
Acreditamos que o campo transferencial pode se configurar em qualquer tipo de contato clínico, isto é, durante entrevistas psicoterapêuticas, psicoprofiláticas ou psicodiagnósticas, as quais podem incluir o emprego de métodos projetivos. Tais procedimentos facilitam, em apreciável medida, o trabalho psicodiagnóstico justamente quando são usados para o desvelamento da relação transferencial estabelecida, com a vantagem, não dispensável para profissionais iniciantes, de serem facilmente supervisionáveis.
No contexto clínico de certa preocupação com a dificuldade de rememoração apresentada por determinado tipo de pacientes e, com a ocorrência da compulsão à repetição, que substituía a recordação, Freud (1914/1948d) chegou a explicar a transferência comparando o campo terapêutico com um playground, no qual os conteúdos infantis inconscientes expressar-se-iam em um contexto lúdico relativamente seguro. A transferência passa, nesta ocasião, a ser vista como uma forte aliada do trabalho analítico não só nos casos em que conteúdos inconscientes foram simbolizados, mas também naqueles que jamais se tornaram conscientes por terem ocorrido em épocas precoces do desenvolvimento, quando tal capacidade ainda não estava disponível. "A transferência cria assim uma área intermediária entre a doença e a vida real, através da qual a transição de uma para outra é efetuada" (p. 349), afirma Freud, referindo-se ao fenômeno de substituição de sintomas neuróticos pela neurose transferencial, a qual, a seu ver, "... representa uma doença artificial em todos os pontos acessível à análise" (p. 349).
Winnicott (1951), introdutor do conceito psicanalítico de transicionalidade, amplia e articula com originalidade as noções de área intermediária, de transição e de brincadeira infantil, já indicadas por Freud no âmbito transferencial. Segundo Winnicott, o bebê bem assistido pela mãe nos primórdios de sua vida emocional (dependência absoluta) desenvolve a capacidade de criar ilusões acerca do mundo e de lidar criativamente com a realidade. Isto estabelecido, estará apto, na fase posterior de dependência relativa, a partilhar com a mãe uma área intermediária, na qual podem acontecer experiências comuns, símbolo tanto da união como da separação do par mãe-bebê. É nesta zona de transição entre realidade e fantasia, entre o "dentro" e o "fora," entre o bebê e sua mãe, que se desenvolve o brincar, atividade lúdica criadora. Na vida adulta, esta região é preservada como área de repouso, à qual se pode recorrer sempre que surjam dificuldades excessivas no enfrentamento da realidade. Este recurso possibilita a superação de frustrações e elaboração de soluções criativas para problemas vitais, evitando que mecanismos defensivos paralisem o trabalho psíquico e a ação sobre a realidade. No âmbito social e cultural, este espaço é preservado e partilhado pelos membros do grupo social, consistindo numa área comum, intermediária entre a objetividade e a subjetividade, a partir da qual é possível usufruir ludicamente e alcançar o relaxamento necessário para a atualização do potencial criativo inerente ao ser humano. Neste espaço singular da vida acontecem a arte, a religião e toda a produção cultural humana (Winnicott, 1971/1975).
Temos salientado (Aiello-Vaisberg, 1996), que os procedimentos projetivos podem ser vistos como concretização particular do método psicanalítico e compreendidos à luz do conceito winnicottiano de transicionalidade. O contexto transferencial, próprio do encontro psicanalítico, não só se presta particularmente à atualização de conflitos infantis, como também ao estabelecimento de um espaço transicional entre o profissional e seu paciente, no qual os procedimentos projetivos podem se alojar como objetos transicionais a serem partilhados ludicamente por ambos os participantes.
Com o desenvolvimento das ciências humanas e com as novas reflexões epistemológicas (Santos, 1987), deixamos de buscar, compreensivelmente, o "aperfeiçoamento" dos procedimentos projetivos de acordo com paradigmas psicométricos, e passamos a considerá-los como uma forma especial de diálogo, que ludicamente enseja o desvelamento da transferência. Já temos definido os métodos projetivos como tudo o que, a partir de uma forma sofisticada de brincar, propicie conhecimento acerca da subjetividade, mediante o uso, pelo profissional, de método de escuta que rompa o acordo consensual dos significados cotidianos e que propicie a emergência de novos sentidos (Aiello-Vaisberg, 1996). Ressalta-se, entre os novos significados emergentes a partir da ruptura do consenso, exatamente o fenômeno transferencial descrito por Freud. Como assinala Herrmann (1979), se pudermos ultrapassar a noção mais difundida que restringe a transferência a "... um conjunto de fenômenos repetitivos, provindos das relações primordiais da infância e atualizados no processo terapêutico" (p. 33) e ampliarmos fecundamente este conceito, poderemos compreender que a transferência existe quando comunicações humanas, que são inelutavelmente fenômenos intersubjetivos, são vistas em função daquilo que permitem apreender, no plano psíquico, quem é aquele que as enuncia. Assim pensando, estaremos aptos a utilizar a transferência como poderoso aliado já durante a realização do psicodiagnóstico.
A angústia, bem como os demais critérios psicopatológicos utilizados por Bergeret (1974), só podem ser apreendidos através da utilização transferencial do método psicanalítico, em entrevistas clínicas que podem incluir o uso de procedimentos projetivos. A partir destes critérios indicativos do modo pelo qual o indivíduo se estrutura/organiza, em termos de personalidade, pode o profissional escolher as estratégias mais adequadas ao tratamento psicoterápico. A par das óbvias conseqüências quanto à eficácia clínica, lembramos que, do ponto de vista ético, é imperioso não confundir a igualdade civil com o desconhecimento das diferenças individuais, as quais exigem ser consideradas para preservação da dignidade, para realização de potencialidades, para alívio de sofrimento e para estabelecimento da justiça. Já contava Politzer (1928) que um pai supostamente muito justo comprava sapatos de um só número para todos os seus filhos, de idades e tamanhos bastante diversos. A mesma técnica psicanalítica, oferecida em situações psicopatológicas e vivenciais muito diversas, pode resultar num incômodo calçado largo ou em torturante aperto dos pés ...


Aiello-Vaisberg, T. M. J. A., & Machado, M. C. L. (1999). Structural Diagnosis of Personality in Psychoanalytical Psychopathology. Psicologia USP, 10 (2), 29-48.
Abstract: This article presents the structural diagnosis of personality, as a clinical practice based on Psychoanalytic Structural Psychopathology and established from Bleger, Bergeret and Winnicott’s theoretical conceptions. The aim of this diagnosis consists on guiding the psychoanalyst through clinical decisions about peculiar techniques and strategies, depending on the kind of psychopathology of each particular case. Projective Procedures, transitionally used on clinical interviews, are specially mentioned, once they provide the access, in a ludic and creative basis, to the latent logical-emotional determinants related to human manifestations.
Index terms: Psychopathology. Psychoanalysis. Psychodiagnosis. Personality development. Projective techniques.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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1 Endereço para correspondência: Instituto de Psicologia. Av. Prof. Mello Moraes, 1721, São Paulo, SP - CEP 05508-900. E-mail: tanielo@uol.com.br
2 Endereço para correspondência: Instituto de Psicologia. Av. Prof. Mello Moraes, 1721, São Paulo, SP - CEP 05508-900. E-mail: mclmachado@uol.com.br
3 Ou seja, o campo determinante do significado das condutas humanas. Desta feita, é possível, mediante o uso do método psicanalítico, apreender/construir o significado de qualquer produção humana a partir da interpretação das subjetividades individuais ou grupais nela expressas. Neste sentido, uma obra literária, por exemplo, é dotada de um inconsciente relativo próprio, que transcende a subjetividade pessoal de seu autor e que se exprime na conduta de cada personagem, no desenrolar da trama, etc.
4 Ao assinalar a possibilidade de uma "normalidade psicótica," o ponto de vista de Bergeret coincide com o de Winnicott (1988/1990), quando este autor afirma que: "O psiconeurótico funciona, aparentemente, a partir da consciência, sentindo-se pouco à vontade com o que se encontra fora da mesma. O desejo de conhecer a si próprio parece ser uma característica do psiconeurótico. Para estas pessoas, a análise traz um aumento da autoconsciência, e uma tolerância maior para com o que é desconhecido. Já os pacientes psicóticos (e as pessoas normais de tipo psicótico), ao contrário, pouco se interessam por ganhar maior auto-consciência, preferindo viver os sentimentos e as experiências místicas, e suspeitando do autoconhecimento intelectual ou mesmo desprezando-o. Estes pacientes não esperam que a análise os torne mais conscientes, mas aos poucos eles podem vir a ter esperanças de que lhes seja possível sentir-se reais."
5 Khan (1970/1977) entende que, no caso de pacientes não neuróticos, a cura deve ser empreendida por meio de uma espécie de aliança com a prática de autocura do paciente (p. 122) e explica que esta consistiria na criação e crescimento de novas capacidades a partir da experiência analítica. Winnicott (1971/1975) afirma que cabe ao analista desenvolver a capacidade de seu paciente para um viver criativo, com base no sentimento de autenticidade do self. Neste sentido, o processo de "cura" é voltado para o cultivo de um bem e não para a extirpação de um mal, o que se reflete diretamente no modo de condução da análise. Pensamos que, especialmente no caso das estruturas psicóticas ou das organizações limites, a questão da cura associa-se diretamente à atualização do potencial criativo individual tolhido durante crescimento emocional devido a deficiências ambientais. Isto pode ser empreendido por meio do desenvolvimento de um espaço potencial entre o par analista-analisando, onde angústias mais primitivas podem ser adequadamente contidas e melhor toleradas.

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