terça-feira, 29 de maio de 2012

ATOS FALHOS, ou PARAPRAXIAS


 

Atos falhos, ou parapraxias






As parapraxias, ou atos falhos, são manifestações de intenções perturbadoras do inconsciente em nossa atividade consciente. Um exemplo de um ato falho são os lapsos de língua, quando trocamos uma palavra por outra ou o nome de uma pessoa por outro.

O esquecimento de intenções também são atos falhos. Ocorre, por exemplo, quando chegamos em um determinado lugar e perguntamos: "o que eu vim fazer aqui mesmo?"

Um ato falho ocorre quando eu saio de casa com uma carta na mão para despachá-la mas percebo que passei por uma caixa de correio e não a deixei lá. Esse esquecimento é um tipo de ato falho. Freud comenta que "...não preciso, como indivíduo normal e livre de neuroses, carregá-la na mão por todo o caminho e ficar à cata de uma caixa de correio onde possa jogá-la; pelo contrário, costumo colocá-la no bolso, seguir meu caminho deixando os pensamentos vagarem livremente, e confiar em que uma das primeiras caixas do correio há de chamar minha atenção e fazer com que eu ponha a mão no bolso e retire a carta. A conduta normal frente a uma intenção concebida coincide por completo com o comportamento experimentalmente produzido das pessoas a quem se deu, em hipnose, uma "sugestão pós-hipnótica a longo prazo", como se costuma chamá-la. Esse fenômeno é usualmente descrito da seguinte maneira: a intenção sugerida dormita na pessoa em questão até se aproximar o momento de efetivá-la. É aí que desperta e impele a pessoa para a ação." (FREUD, 2002)

Os atos falhos ocorrem para evitar o desprazer. Eles são sempre sintomas de algum tipo de conflito psíquico. No caso da carta, o ato de depositá-la na caixa de correios poderia entrar em associação com conteúdos psíquicos que quero manter recalcados. Por essa razão, um mecanismo psíquico atua para que a ação não seja executada, e nesse caso, para que eu esqueça minha intenção de colocar a carta no correio.
Um outro ato falho muito comum é a substituição de nomes, isso é, quando vamos chamar uma pessoa e trocamos seu nome pelo de outra pessoa. Ou então quando esquecemos o nome de uma pessoa. A real motivação da troca de um nome pelo outro ou pelo seu esquecimento pode ser analisada.
Se alguém também afirma: "'Não me peça para fazer isto, tenho certeza de que vou esquecer!'", a realização dessa profecia, segundo Freud (1997), nada tem de místico, pois "quem assim fala sente em si a intenção de não executar o pedido e apenas se recusa a confessá-lo a si mesmo."
Os atos falhos, por se manifestarem em todas as pessoas, e não apenas em neuróticos, é um dos principais meios de acesso às descobertas da Psicanálise. Tanto que Freud escolheu este tema como o primeiro a apresentar em suas "Conferências Introdutórias sobre Psicanálise" (volumes XV e XVI da Edição Standard das Obras Completas).
Para ilustrar um ato falho de esquecimento, relato um incidente que me ocorreu recentemente. Estava apresentando um trabalho em sala de aula sobre o julgamento de Sócrates. Durante minha fala me esqueci completamente de uma palavra, o que foi constrangedor, pois fiquei alguns segundos calado, em pé, diante de toda a classe, que esperava que eu desse prosseguimento. Com a ajuda do texto que tinha em mãos consegui recuperar o termo reprimido: era a palavra "acusação".
Depois que terminei e me sentei, tentei analisar este episódio e logo encontrei seu motivo: a palavra "acusação" estava associada a "julgamento", o que se associava com o receio de que a audiência estivesse julgando ou acusando a apresentação que eu estava fazendo. E o contexto era propício a isso porque, como já afirmei, o tema do trabalho era o julgamento de Sócrates, e estávamos comentando a obra "Apologia de Sócrates", de Platão.
Os atos falhos foram agrupados por Freud em sete tipos: orais, escritos, de falsa leitura e de falsa audição, esquecimento temporal, perdas e atos sintomáticos. Alguns guardam muitas semelhanças com outros, como os lapsos de língua e os de escrita, por exemplo.
Por serem bem mais simples de interpretar do que os sonhos, são um bom caminho para quem deseja iniciar seus estudos em Psicanálise. São uma clara manifestação da nossa psicopatologia da vida cotidiana, uma demonstração bem acessível de que todos nós somos, no mínimo, levemente neuróticos.
REFERÊNCIAS
FREUD, Sigmund. Sobre a psicopatologia da vida cotidiana. In: Obras Psicológicas Completas. Rio de Janeiro: Imago, 1997.
KEEGAN, Paul. Introduction. In: FREUD, Sigmund. The psychopathology of everyday life. London: Penguin Classics, 2002.

Nenhum comentário:

Postar um comentário